sábado, 29 de janeiro de 2011

51 Inaugurando a aula inaugural

Ontem, tivemos a primeira aula da UniPau. Aula inaugural, como é chamada nos meios acadêmicos. Aqui, ao contrário das universidades do mundo inteiro, todas as aulas serão inaugurais. Ou, dito de outra forma, todos os cursos se resumirão à aula inaugural. O resto é dispensável, encheção de lingüiça, uma chatice insuportável, por isso, banido da nossa instituição. A aula inaugural não. Essa tem tudo de bom: é curtinha, mil badalações, só gente bonita, paparicagem global, pouco papo, mínimo blá-blá-blá, que, na verdade, acaba sendo apenas uma introduçãozinha para a segunda parte essencial, a que de fato interessa: o tradicional coquetel universitário, no qual só entram os convidados especiais. O estudante, por exemplo, esse ser repelente, repulsivo e nauseante, que contamina e conspurca a vida acadêmica, que só atrapalha e prejudica o ambiente (um pagante mal-necessário para as universidades), tem sua entrada totalmente vetada. A lei é muito branda e leniente com esse corpo estranho, já que deveria limitar sua participação na escola, unicamente, ao pagamento das mensalidades. Todo o resto lhe deveria ser proibido. Mas, vá lá, o ordenamento jurídico faculta a ele, por absurdo que seja, o direito de assistir às aulas, (mudo e calado), mas, dá ao professor o superdireito, mais sagrado ainda, de reprová-lo. Essa é a primeira e grande função do professor: reprovar o aluno. A reprovação é o mais importante recurso pedagógico (opinião comum aos grandes pedagogos, de Faulo Preire a Tanísio Eixeira, de Comenius ao Professor Pardal): aluno reprovado paga duas vezes. Ou muitas. No coquetel, por sorte, não havia essa subespécie de protozoário inferior. Nossa primeira aula inaugural, ou inauguraula (primeira, já que, como vimos, todas as demais serão também inauguraulas) é conhecida na tradição histórica da UniPau como Unipaula.Tradição histórica? Estará se perguntando o mentecapto leitor. Tradição histórica sim. O asinino ledor não deve estar lembrado, como é de se esperar, porém, na Itinerância 40, quando fechamos o negócio universitário com o Abutre Calhorda, foi dito claramente que compramos o projeto inteiro. Ainda lembro que usei a expressão “porteira fechada”, ou seja, compramos um pacote com tudo dentro, incluindo, nesse tudo, (que é tudo mesmo), uma história acadêmica de mais de 50 anos. Tudinho aprovado pelo MEC e registrado em cartório de Brasília (cartório em Brasília é mais cartório). Então, apesar de estarmos no primeiro minuto da nossa inauguração, temos já uma vida cinqüentenária: pessoas famosas, artistas, ministros e até ex-Presidentes da República estudaram na UniPau, tanto no passado recente, como no remoto. Nesta primeira unipaula, tivemos não apenas um conferencista, mas uma mesa redonda composta por três personalidades do mundo do conhecimento acelerado (há celerado?) de renome internacional: em primeiro, o atleta-fundador da Ambev, que discorreu sobre o tema: “a cervejolatria como único caminho de salvação”; em segundo lugar, o líder espiritual da ONG, recentemente indicada para o Prêmio Nobel da Paz, “Dorminhocos Sem Fronteiras” que, numa demonstração da pacífica proposta de sua entidade, dormiu o tempo todo e, por último, exibiu-se o Secretário-Geral da CBCA - Companhia Brasileira de Corrupção Ativa - que apresentou work-shop sobre a recém-iniciada construção do Propinoduto Brasília-São Paulo-Rio de Janeiro-Belo Horizonte-Brasília, obra celebradíssima na mídia, mas que está sendo objeto de veementes protestos e pesadíssimas denúncias, em especial pelas autoridades de capitais como Curitiba, Porto Alegre, Salvador e Recife, por terem ficado de fora do traçado original da mamogandaia. Depois de aplaudidíssimos os dois primeiros, sobrou uma estrondosa vaia para o mamólatra, culminando com sua expulsão do evento e a sustação dos cheques em branco, que seus assessores haviam coletado durante o ato acadêmico. O tratamento hostil dispensado ao representante oficialista deve-se ao fato de que em Pau Doce aceitamos, no máximo, uma corrupçãozinha das mais passivas possíveis (uma multinha de trânsito perdoada por aqui, um impostozinho de renda não cobrado por lá, não mais do que isso...). Uma vez escorraçado o cachaço, a festa continuou como se nada tivesse acontecido. Da primeira intervenção, ficou marcada indelevelmente em nossas mentes, a “teoria da fermentação”: o processo químico da fermentação da cevada, uma vez desencadeado quando da ingestão da cerveja, penetra em cada célula do corpo (todas elas desesperadas para tirar o pó da garganta) e provoca a expansão comprimida da substância conhecida pelo nome técnico de H3P9, “agatrespenona”, responsável pela higienização do núcleo celular, através da incineração dos resíduos gerados pelo processo de biocontinuidade molecular aguda (popularmente conhecida como “a vida”). Tal limpeza pode ser obtida, também, ainda que de forma relativamente precária, por compostos medicamentosos alopáticos, porém, com alta possibilidade de sérios efeitos colaterais (cuja principal sintomatologia é a destonalização e desafinação vocal e, em sua fase mórbida, a reversão irreversível da opção sexual heterodoxa, também conhecida como “sexo-sócio-rearmarização”). A ingestão de cerveja, porém, através da ação da agatrespenona, aumenta a longevidade celular global, multiplicando-a indefinidamente. Essa quase pré-imortalidade leva o indivíduo, (qualquer que seja a sua opção religiosa, ou mesmo não possuindo uma, ou ainda, sendo um ateu ativo), a um estado de exaltação espiritual, definido pela Organização Mundial das Igrejas e Quejandos como “estágio de salvação endêmica”. Terminada esta bela conferência (bela, sobretudo, porque desde os prolegômenos à conclusão final não levou mais de dez minutos), o segundo expositor utilizando-se, muito sabiamente, da técnica da vivência real, tendo já dormido o tempo todo da fala de seu antecessor (tempo muito curto, como vimos), continuou roncando quando lhe foi facultada a palavra. Aplaudidíssimo, depois de 15 minutos de demonstração prática de sonoatividade induzida, acordou a tempo de tomar sua champanhota geladinha. A primeira unipaula foi sucesso total, menos pelos dois primeiros heróis acima resenhados, e muito mais pela despaudocização do enviado de Brasília, que segundo notícias da Marinha do Brasil, neste momento, continua nadando, agora já a poucas milhas do litoral africano. Saravá!

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