quarta-feira, 29 de dezembro de 2010

45 Há tletas em Pau Doce (mandando ver)

Quando fiz meu curso de “Arte Antiartística e Desarticulada” na Escola de Bolas Artes de São Paulo, um curso de extensão universitária tipo “espera-marido” (que não era meu caso – nem meu caso, nem meu marido), sem atribuição de nota ou registro de freqüência, mas, mesmo assim, um belo curso, com belíssimas professoras e re-belíssimas alunas, como, aliás, não poderia ser diferente na Bolas Artes, como ia dizendo, quando fiz esse curso aprendi muitas e utilíssimas coisas. Coisas. O que são coisas? Pode parecer ao desinformadíssimo leitor que coisas sejam apenas objetos indefinidos, não cabendo, de forma alguma, em minha frase anterior. Engano, equívoco, estultice. A palavra “coisas” envolve um universo de sentidos, mesmo que alguns não tenham qualquer sentido. São idéias, propostas, conhecimentos, posturas, sentidos, informações, cognições, dicas, toques, abstrações. Entre esse enorme cabedal, aprendi, naquela quarta-feira à tarde, algo que nunca mais esquecerei. Naqueles quinze minutos em que estive presente no curso, conheci a Grécia. A Grécia com seus filósofos, sua arquitetura, seus escravos e, sobretudo, a Olimpíada. (O curso era muito concentrado). Desde aquele momento, fiquei vidrado na Olimpíada. Por isso, aqui em Pau Doce, eu e outros olimpiólatras resolvemos promover algo parecido. Por motivos óbvios, não poderia ser a própria e nem mesmo seu desdobramento politicamente correto, a Para-Olimpíada, disputadas por deficientes físicos. Assim, depois de muito neuronizar, optamos por sediar algo totalmente novo, mas inspirado na matriz grega. A proposta aprovada foi a de que realizaríamos a Trans-Olimpíada. E o que é uma Trans-Olimpíada? Estará indagando-se o atabalhoadíssimo leitor. Trans-Olimpíada é uma multi-disputa, nos moldes das duas irmãs mais velhas. Mas, então, em que ela difere das outras? Insistirá o tão insaciável quanto ignaro leitor. É o seguinte (vou escrever devagar e detalhadamente para que o seu apequenado cérebro possa processar as informações): é um conjunto múltiplo e variado de torneios, campeonatos, competições e embates de diversas, diferentes e distintas modalidades esportivas, culturais e que tais, nos quais os melhores colocados recebem medalhas metalizadas de bronze (3º lugar), de prata (2º) e de ouro (1º). E a diferença, pelo amor de Deus? Estará se desesperando o desesperado e afoito leitor. A grande marca diferenciadora da OlimPau é que seus atletas são todos dependentes profissionais. Recordistas nas mais diversas modalidades de dependência: alcoólica, narcótica, sexual, alimentar e tantas outras. Há, porém, muitas outras diferenças. Enquanto as esportivas ocorrem a cada quatro anos, sempre em grandes capitais, escolhidas com mais de uma década de antecedência, para que possam ser preparadas adequadamente, a Trans-Olimpíada acontece todos os anos e sempre aqui em Pau Doce. Enquanto aquelas são organizadas pelo COI (Comitê Olímpico Internacional), a nossa fica nas mãos do COTODEPAU (COmitê Trans-Olímpico DE PAU Doce). Nas duas enfadonhas olimpiconas, os atletas passam por rigorosos exames anti-doping. Já na OlimPau há exames, igualmente rigorosos, mas pró-doping, pois em nossas competições não são admitidos participantes caretas que atuem de cara limpa. Isso seria uma completa desmoralização da idiossincrasia paudocense. As competições, com repercussão mundial, dada a intensa cobertura da mídia internacional, duram, aproximadamente, três meses, mas, dependendo de algumas modalidades mais elásticas, podem ultrapassar todo um semestre. E quais são as modalidades? Estará se perguntando o comichânico leitor. Modalidades há muitas, muitíssimas. Elas estão divididas por tipo de dependência. Iniciando pelo alcooleiro: 1- Salto de altura etílica, que é vencido pelo competidor que possuir maior teor alcoólico no sangue (somente os que terminam vivos o embate podem ganhar medalhas). 2- Lançamento de garrafas vazias a distância (depois de esvaziadas de uma só vez). 3- Corrida de revesamento com Velhas Barreiras e sem as ditas Barreiras (só com pinga de garrafão). 4- Nado: 100 metros livres dentro do alambique, também conhecido como “nadando e bebendo”. 5- Tiro ao álcool (iniciando com Tiro a Rolha, porque sem tirá-la não há tiro que dê jeito). Já no setor sexual: 1- Salto tríplice na corda bamba sem sair de cima. 2- Maratona das marafonas. 3- Torneio de tamanho de tênis, com os competidores nus, mas, obrigatoriamente, calçados com pênis. 4- Campeonato de pênis de mesa e com as sub-modalidades: pênis de cama, pênis de poltrona e, a mais recente, pênis de bidê. 5- Salto na vara (em cima dela, de preferência). No setor de dependência química: 1- Torneio de aspiração de gases tóxicos e inalação de psico-efluentes. 2- Campeonato de alpinismo no plano: “Esse pico é meu!”. 3- Aspiração de carreiras ornamentais. 4- Queimação de bombas medley (4 tipos de pegas). 5- Ecstasy pra que te quero (arremeço de comprimidos G.A. –goela abaixo). Finalmente, na área da DP alimentar: 1- Nado de costas na sopa de cebola. 2- Saltos ornamentais com guarnições de farofa e batata frita. 3- Levantamento de pesos assados, por quilo. 4- Correndo, cozendo e comendo. 5- Saltos tríplices em aparelhos de fondue. Outras modalidades estão sendo estupradas (estudadas e compradas) para completar o conjunto total absoluto geral da TransO. Como já é de praxe na cultura paudocense, o COTODEPAU está, ainda, na fase preliminar da preparação preambular do planejamento prévio do esboço do boneco do rascunho do que poderá (ou não) vir a ser a proposta da idéia possível da pré-concepção prospectiva e futurível da Trans-Olimpíada de Pau Doce. Sentiu firmeza?

sexta-feira, 24 de dezembro de 2010

44 A reinvasão das vulvas desenfreadas

Finda a pausa, vamos às mulheres. Da montanha, então, elas surgiram como que do nada. Mulheres imensas, de pernas intermináveis, seios e glúteos entumecidíssimos, vastas cabeleiras loiras e azuis e expressões lascivas nos rostos descomunais. Muito mais descomunais que os rostos eram suas saliências, entrâncias, reentrâncias e intumescências vagino-abissais. Verdadeiros sugadores atômicos, brutalmente autônomos e descontrolados, pareciam ter vida independente de suas portadoras. Quando começaram a penetrar, como um exército vulvaleone, como uma inexorável divisão panzer, vagarosa, mas devastadora, Pau Doce estava vivendo o auge da orgia nanocopulativa dos pigmeus protuberantes, que invadiam compulsória e compulsivamente todas as aberturas encontráveis e disponíveis: humanas, animais, vegetais e minerais (estas últimas provocando inúmeros acidentes e muitas baixas entre os baixinhos). A primeira reação ante a nova invasão foi a ostensiva indignação das fêmeas paudocenses (humanas e animais) frente àquela concorrência por todos os sentidos desleal, já que as vulvas chegantes, algumas ao menos, não mediam menos do que meio metro (talvez cinqüenta centímetros pareça menos escrachado), se medidas desde o ápice da cumieira frontal até o final da ponta da derradeira encosta, nas cercanias dos baixios recônditos. Para aumentar a caótica e desesperada confusão, os machos locais, todos equilibrando com enorme dificuldade os gigantescos chifres, enxergaram naquela novidade a oportunidade da vingança, algo como a deschifrenização dos cornos e, de instantâneo, como que compelidos por uma vigorosa voz de comando, atiraram-se, coletivamente, em direção às macro-vulvas. Por sua vez, suas respectivas fêmeas revoltaram-se superlativamente contra aquela inominável traição, já que para elas a única traição aceitável (e até recomendável) era a feminina. Masculina, jamais. Elas, que já se haviam indignado pelo temor de perder para as forasteiras a exclusividade dos serviços dos pigmeus, com a desaforada atitude dos seus machos, atingiram a fúria total. Incontroladas, partiram, às centenas, em direção e à caça das amazonas vulvulares, enquanto os machos dividiam-se entre a mesma busca (com objetivos claramente distintos) e à fuga de suas furiosas consortes. As gigantes, por sua vez, sem nada entender e achando aquela gente completamente doida, ou, na melhor das hipóteses, irremediavelmente maluca, buscavam esquivar-se de uns e defender-se de outras, ao mesmo tempo em que, sem se darem conta, esmagavam centenas de anõezinhos com seus pés acachapantes e avassaladores, como quem pisa sobre uma assembléia de baratas. Os pigmeus, então, pela primeira vez interrompendo suas cópulas compulsivas (os que não eram pisados e esmagados, já que esses não interrompiam, mas eram interrompidos) segurando suas armas em riste (a única que possuíam) lançaram-se contra todos os outros três contendores: fêmeas, machos e invasoras. A batalha tomou todo Pau Doce. Um quebra-Pau generalizado (claro que não apenas os paus eram quebrados, mas outros órgãos iam juntos pro vinagre). As hiperdotadas, quando perceberam que o que estava rolando não era uma recepção própria do ensandecido folclore local, nem uma suruba coletiva e sim uma batalha filha-da-puta e generalizada, pararam de cometer pigmeusicídios involuntários e iniciaram uma higiênica despigmeulização, desmachização e desfeminização de Pau Doce. Os anõezinhos, por sua vez, conscientes de que a fodeção geral fora interrompida (coitus interruptus), desenvolveram um feroz brado de luta: “Ah! É guerra, é?” e, em pequenos grupos de 300, de 400, se abatiam sobre uma vítima (se fosse das invasoras), ou 15 inimigos (se fossem machos) ou 30 alvos (se fossem fêmeas- nesse caso, porém, doidos pra transformar a briga num bacanal). Os machos paudocenses, na maior mangüaça da paróquia, tentavam bater em tudo que se movia, mas acabavam sempre dando porrada neles mesmos (o verdadeiro “fogo amigo”). As fêmeas, enquanto isso, percebendo que eram muito maiores que os pigmeus, muito mais rápidas que as invasoras e muito mais sóbrias que os machos, iam contornando o precipício pela borda externa, atravessando o vulcão por baixo da fumaça, comendo o mingau quente pela beirada e costurando a fronha pelo avesso. Depois de sete dias de guerra total e ininterrupta, as gigantes haviam sugado dez mil pigmeus vulva adentro, pulverizando-os. Cambaleantes e prostradas bateram em retirada em direção à montanha. Os machos que não morreram de coma alcoólica, deixaram-se dominar, manietar e gomorrizar (sodomizar nunca! Macho que é macho aceita tudo, menos bafo no cangote), sempre na esperança de tirar o pó da garganta. As fêmeas, vencedoras da guerra da quádrupla desaliança ou, (como ficou oficialmente gravada em nossa história) Guerra Púnica (dada a assombrosa incidência de disfunção flatulenta nos combatentes), inebriadas pela vitória e por outras mumunhas impublicáveis e incontáveis, tomaram o poder e assumiram o comando da reconstrução do Pau Doce. Até hoje, passados tantos arquianos e tantas léguas temporais, Pau Doce continua uma terra vulvular, na qual o homem é o último que fala e o primeiro que apanha.

domingo, 19 de dezembro de 2010

43 A invasão dos pigmeus superdotados

Para aquele que não conhece Pau Doce e que lendo estas Itinerâncias tenha ficado com vontade de conhecê-lo, ou até mesmo de transformar-se em morador desta praia, virar paudocense, paudocencizar-se, vou narrar um episódio histórico que fez deste um vigoroso Pau, soberbo e soberano e não apenas adocicado. No ano do acontecimento em tela, Pau Doce já havia sido descoberto, conquistado, colonizado, sodomizado e já vivera dias memoráveis na memória dos menos desmemoriados. Enfim, já era um Pau falado. O ano exato foi aproximadamente, mais ou menos com certeza quase absoluta sete mil dozecentos e trezenta e zero. Se o oligofreníssimo leitor está com dificuldade de identificar o citado ano, é só lançar mão de um calendário hitita ou drusometalíngeo, facilmente encontráveis em qualquer loja de 1 e 99, nos quais (calendários, evidentemente) o ano é composto de apenas um mês , que, por sua vez, comporta 28 submeses, divididos estes em meio inframês cada um, seccionados em 9,78413 dias. Utilizamos estes calendários, primeiro porque são mais fáceis de entender, depois, porque são idênticos entre si (o hitita e o druso), mas, primordialmente, porque ninguém os conhece, o que evita contestações e mal-entendidos. O ano inicial deles (dos calendários) não é, como é óbvio, nem o nascimento de Cristo, nem o da circuncisão de Maomé, nem o da santificação de Nero, nem o da gravidez de Sicrofanta, mas o da lapidação de Tutankaguey, o Passivo, também conhecido por seu exuberante lombo, com o qual distribuia frenéticas lombadas, derrotando exércitos inteiros, esgotando os valorosos inimigos, minando suas forças (nunca forçando suas minas, é claro) e exaurindo suas libidos, sendo, por essa razão, também chamado de Retoletal, o Culminante. Bom, na dita data Pau Doce foi palco (mais do que palco foi o teatro inteiro) de um acontecimento tanto inusitado quanto nunca visto: uma invasão de pigmeus antropófagos que coincidiu com outra invasão, a de gigantescas mulheres ninfomaníacas. Imagine só, limitadíssimo leitor, duas invasões sobrepostas perpetradas por invasores tão diferentes e, de fato, mutuamente excludentes. Foi um horror pânico, uma hecatombe nuclear, na verdade, uma situação complicada, difícil, um pouco incômoda, que não passou de uma encheçãozinha de saco. Os pigmeus eram tão pequenos e com membros tão descomunais (não os membros superiores ou inferiores, mas os do meio) que mais pareciam aparelhos detectores de metal de filme de ficção científica de 3ª classe. O que tornava essas minúsculas miniaturas um grande perigo eram a enorme quantidade de espécimes, sua velocíssima capacidade de reprodução e o fato de se apaixonarem com extrema facilidade. Chegaram, segundo fidedignos relapsos, relapsos não, relatos, aos milhares, em pequenos barcos que mais pareciam grandes bacias – dessas usadas para lavar roupa na pré-história – e, nem bem desembarcaram, ainda na areia da praia, já começaram a proliferar com toda e qualquer fêmea que encontrassem pela frente (e por trás também), independentemente da espécie feminina: garanguejas, gatas, cadelas, professoras, donas-de-casa, prostitutas (as quais eles evitavam porque cobravam muito caro). Nem as monjas do 7º dia foram desprestigiadas. Naqueles dias, Pau Doce transformou-se na maior cornolândia que o mundo conheceu (naqueles dias, não, desde aqueles dias). Homens desconsolados choravam em grupos, sem vergonha de serem infelizes, alguns abraçados e fungantes, outros com o olhar vazio fitando um horizonte impossível de ser visto, outros ainda, numa revolta inútil, proferiam ameaças contra todos os copuladores alienígenas e procuravam armar-se para perpetrar uma vingança inviável. E, tal qual os homens, também os caranguejos-machos, os gatos, os cachorros, os bacuris, os orangotangos, todos desesperados, mas não tanto, nem com a mesma veemência dos cornos humanos, apenas algo entristecidos e desmachificados. Só os veados pareciam não se comover muito com a preferência dos pigmeus e suas cornealíssimas conseqüências. As mulheres e fêmeas, de um modo geral, (somente as em idade fértil e de folga) desfilavam um sorriso de felicidade edênica, suspiravam longos suspiros, cantarolando baixinho canções obscenas, colhiam flores para enfeitar os cabelos, atitudes que só faziam aumentar o desespero e a revolta da macharia ferida. Os pequititicos penetradores da virtude alheia, podiam ser vistos (apenas os de folga, evidentemente) trespassados de cansaço e suor, fumando libidinosamente durante os rápidos interregnos que separavam as cópulas. No auge da carnificina, quando tudo parecia indicar a analização e pigmentação de Pau Doce (o domínio de anões e pigmeus) como fato consumado e irreversível, quando havia certeza coletiva de que não havia hipótese de que a situação viesse a piorar, já que não poderia haver nada mais catastrófico do que a desgraça que havia se abatido sobre os pacatos e chifrudos cidadãos, o pior aconteceu. Inopinadamente, surgiu, agora não do mar, mas da montanha, um batalhão de enormes mulheres. Um batalhão de mulheres? Depois dos pigmeus tarados, um batalhão feminino? Só mesmo fazendo uma pausa...

terça-feira, 14 de dezembro de 2010

42 Assando glúteos e bíceps

Hoje é dia 31 de fevereiro e, por isso, madruguei. Consegui abrir os olhos em pleno amanhecer, exatamente às 3 e 15 da tarde. Para quem madruga sempre por volta das 18 horas, hoje caí da cama. Mas, há uma forte razão pra esse enorme sacrifício. Hoje é o Dia de Pau Doce. O mesmo dia em que no ano de mil trezententos e vintenteum arribou nesta paradisíaca Sodoma o descobridor Dom Cornélio Manso, com toda sua mansíssima cornitude e inaugurou a saga bacanalíssima do melhor pedaço, da fatia especial, do filé minhom do inferno, com tudo aquilo que de belo, biruta e bestial (os famosos três bês) tem o paraíso infernal. Mas, indo direto ao que interessa, ao ânus da questão, acordei cedo para participar das comemorações cívico-sacano-etílico-sodomitas do CHUPANDOHOPAU (CHUrrasco PANtagruélico DOgmático “HOnrando PAU Doce”). Com este superfaraônico hollywoodianohiperespecial evento, Pau Doce comemora o Dia de Pau Doce, como só Pau Doce sabe comemorar o Dia de Pau Doce. Nada a ver como os outros comemoram os seus: a China, com desfiles militares para os quais o povo é convidado, mas não vai; ou os Estados Unidos, com desfiles militares para os quais o povo vai, mas não é convidado; ou o Brasil, com desfiles militares para os quais o povo não é convidado e também não vai. Aqui, não há desfiles de milicos, já que os únicos desfiles permitidos são: o dos femininos e bem fornidos glúteos, tostados de sol e de sal, obrigatoriamente descobertos (descobertos em todos os sentidos) e o dos bíceps masculinos, torneados alguns, retesados outros, mas todos salubérrimos e metidos-a-besta. Ao invés dos desfiles encoturnados, ao som de marchas militares (o gênero musical que mais tem a ver com o ser humano, já que foi inventado para a guerra, outra maravilhosa criação humana), Pau Doce promove um espetacular churrascoletivo para o qual todos e cada um são convidados. Mas, o grande CHUPANDOHOPAU não é um churrasco como os outros que existem por aí, o argentino, o gaúcho, o uruguaio, o caipira. Não, não, não. Nosso churrasco é nosso. E como tudo o que é nosso, é diferente, é especial, não imita ninguém. E como é o churrasco de Pau Doce? Estará se perguntando o sempre abilolado leitor. Para começar, em nosso churrasco a carne, de qualquer espécie, está banida. Nada de costelas, picanhas, ossobucos, mocotós, pulmões, traquéias, pés e “la concha de la lora”. Na verdade, na verdade, em nosso churrasco a carne não está banida coisa nenhuma. Nosso churrasco é de carne, como não? De carne humana. São maminhas, músculos, glúteos e até picanhas (cada picanha!). Tudo tostado ao sol, temperado pela salmoura do mar. Já a parte gastronômica, propriamente dita, consta de saladinhas, refogadinhos, mexidinhos, abobrinhas no espeto, chuchuzinhos puxados no alho, picadinhos de frutas, arroizinho de água-benta, ovinhos cozidos na areia, feijãozinho com broto de goiabeira e tantas outras delícias da cozinha desnaturada própria do inimitável churrasco vegetariano de Pau Doce. Mas, o CHUPANDOHOPAU é importante, diria mesmo, transcendental, pois atrai chupadores do mundo inteiro (chupadores: CHUrrasqueirosos PAntagruélicos DOgmáticos). Sim, do mundo inteiro e até de outros países, incluindo um ou outro de alguma cidade brasileira e, mesmo, por incrível que pareça, uns poucos desavisados de alguma praia vizinha, que, na verdade, muitas vezes, não passam de morador aqui mesmo do pedaço, pois, são raros os paudocenses que comparecem, tirando aquela meia-dúzia de sempre. O fundamental, porém, é que, em que pese não passarem de três ou quatro, são todos autênticos chupadores (todos chupadores de Pau Doce, como já se sabe). E o que, de fato, são esses tais chupadores? Estará se inquirindo o imaginativo leitor, normalmente dono de uma verdadeira caatinga mental. CHU: CHUrrasqueirosos. PA: PAntagruélicos. DO: DOgmáticos. RES: é RES mesmo, mera partícula complementar. E que diabo são Churrasqueirosos Pantagruélicos Dogmáticos? Continuará o insistente leitor em sua oceânica nihilidade. Trata-se duma ONG mundial, com sede em Pau Doce e ramificações nos nove continentes (cinco na terra, dois na lua, um em Marte e um no Rio de Janeiro – mas este está dominado pelo Comando Vermelho), todas ainda em fase de pré-projeto de ante-proposta prévia. Membro, membro mesmo, só os três ou quatro de sempre. E o que fazem, o que propõem, pelo que lutam esses três ou quatro chupadores? Seguirá bisbilhotando o tão fofoqueiríssimo quanto desmentalizado leitor. Churrasqueirosos são pessoas iluminadas e divinamente escolhidas que têm em comum “asco por churrasco”, odeiam-no veementemente. Pantagruélicos, (relativo a Pantagruel, o famoso personagem de Rabelais, glutão inveterado), pois tudo em Pau Doce é pantagruélico, mesmo os que têm asco por churrasco. Dogmáticos: que não abrem mão um milionésimo de milímetro sequer dos seus princípios (a não ser que a negociação seja boa e interessante, caso em que, tranqüilamente e sem traumas, tornam-se antidogmáticos). Assim, juntando tudo num balaio só, temos: indivíduos que, apesar de voracíssimos, não abrem mão de seu asco por churrasco. Esses três ou quatro ongueiros, além do asco por churrasco, adoram o nome da comemoração, CHUPANDOHOPAU, e fazem dele um estilo de vida.
PS: Tô fora dessa ONG, naturalmente.

quinta-feira, 9 de dezembro de 2010

41 Reflexão irrepreensível

Síndrome de abstinência alcoólica é essa coisa tão bíblica que é pior que praga de sogra, segundo os desafortunados genros, pior que crise de rins, que queimadura de 1º grau. Poucas vezes passei por essa agonia e todas elas antes de vir para Pau Doce. Nas duas ou três vezes que vivi a “sindrabs”, ao lado do extremo desconforto, falta de ar, coceira aguda, garganta seca, dores mortais, senti, por mais contraditório que pareça, meu raciocínio lógico, perfeito, quase científico, com raro sentido de totalidade, penso logo emito, tenho pensado sempre que tenho pensado grande e tenho pensado muito que quando penso sobrecarrego de tal maneira de sinapses relampejantes nas cordilheiras contra o céu escuro das negras noites de tempestades que são tão passageiras quanto são fugazes os pores-do-sol auríferos e quentes bules de café que servem xícaras fumegantes marias-fumaças resfolegantes e apitadeiras dobrando ao longe a curva de seu seio esquerdo com o botão rosáceo e gotejante de seiva branca como a barba anciã de meu avô solene e meigo como um passarinho cantando cantos e gorjeando sons de outro planeta que não seja Urano, distante, invisível pleno de mistério caso de polícia inexplicável crime aterrador, atroz, incrível como loiros negros, índios, cafuzos e mamelucões amalucados palhaços bailarinos no grande circo com trapezistas, magos, três com seus camelos transportando mirra, incenso e ouro, dólar, bolsa, investimentos a perder de vista a camisa e calce o sapato abotoando com delicadeza de cirurgião plástico e papel-de-seda, varetinhas de bambu e rabiola comprida voando ao vento forte do mês de agosto, setembro e outubro bom trimestre de vendas no mercado interno e na exportação de sonhos e projetos de vida longa para todos os heróis anônimos e desconhecidos do meio do povo, raça e etnia conceitos confusos e de parco consenso mesmo entre os especialistas em otorrinolaringologia estão de acordo que a baixa umidade do ar de gente grande mesmo não tendo chegado à adolescência e velhice são estágios especialmente delicados momentos de passagem única para metrô e os ônibus que alongam o trajeto para a periferia do sistema solar diminui a força de gravidade em relação ao sol do meio-dia, a lua da meia-noite, a crise da meia-vida, o preço da meia-calça em qualquer liquidação de outono e inverno no hemisfério norte com temperaturas recordes nos registros meteorológicos canadenses, australianos e sudaneses disputando um interessante torneio de tênis de mesa branca da linha kardecista fundada na crença da reencarnação dos mortos de fome por toda a região das caatingas nordestinas empobrecidas pela falta de chuva de papel picado enquanto ele segura, impassível, desfilando em carro aberto o pão ao meio para, então, untá-lo com manteiga e fios-de-ovos, meia colher de açúcar cristal, uma pitada de sal e xícara e meia de água que brotava de sub-solo como se o núcleo da terra fosse liquido e efervescente participação dos mais renomados próceres da Transnumância Boreal e da Organização das Nações Unidas e desunidas sejam quais forem as condições de coesão social suas reivindicações não serão atendidas pelo serviço de emergência municipal de saúde do idioma deve ser preservada não através de leis xenófobas e discriminatórias de todo o rol de produtos colocados a venda na feira de antiguidades milenares aberta todos os domingos haverá celebração triunfal das bodas imperiais na catedral do amor e da esperança que é a última que morre a volúpia do querer e possuir alguém que ser possuído não deseje tomar esse sorvete de maçã do rosto toda tão vermelha cor de sangue tipo “O” universal utilíssimo por sua enorme aplicabilidade estatística, econometria, geografia humana, alma, calma, relva, coisa, dentro, d’outra, fitos, fatos, fetos, abracadabras, abacalhoadas, nesgas, rusgas, cismas, paradelepípelos, losangos, mangos, rangos, tangos, prosopopeiaspindamonhandubas, protonotário, epigmação, groeneumilese, clemitofatrício, clausiinísilo, amorficênteras, nafrunoplistrofênio, frafrandiralenco, fruss, brrrruuuss, brrruuss, brruss, brus, br...

sábado, 4 de dezembro de 2010

40 Supremo estudo superior

Outro dia, no Esfola o Pinto, o boteco do Pinto Mole (na verdade, seu nome completo é o altivo e digníssimo Alcides Aristodemo do Pinto Molerembaun), lá pelas muitas da madrugada, discutíamos pastosamente, entre um coma alcoólico e outro (aliás, ocorrenciazinhas quase diárias e sem importância), a nossa vida em Pau Doce (ou seria a nossa doce em Pau Vida? Não lembro). Lembro, sim, que concordávamos todos que o nosso queridíssimo Pau era o lugar ideal para se viver, que até o final de nossas existências continuaríamos sendo como criancinhas inocentes, quase bebês, mamando e dormindo o tempo todo. E, quando entre nós, alguém quisesse mudar tudo em sua vida, revolucioná-la, era só dar um giro de 360º e, assim, continuaria mamando e dormindo. Mas, se, de fato, resolvesse partir para outra e dar uma guinada de 180º, virava tudo de cabeça para baixo ou de pernas para o ar (segundo o ângulo e a opção sexual) e, aí sim, passaria a viver dormindo e mamando. Lembramos, lembrei, lembrou (não tenho presente se fomos eu ou fui eles) que Pau Doce era maravilhoso porque tinha tudo que alguém podia desejar. Apesar de ser uma minúscula praia do litoral norte do Estado de São Paulo, nada de moderno, tradicional, “in”, e o cacete a quatro, lhe faltava. Tínhamos tudo, absolutamente tudo. Foi aí, eis quando senão que Alguém lembrou (Alguém é o protótipo do desmancha prazer, um mala de 3 toneladas com alça de arame farpado, que no batismo recebeu o sonoríssimo nome de Alguém Dalomba Namatta Virgem) que tínhamos quase tudo, mas não tudo, já que não possuímos uma Universidade. Tínhamos de pipoqueiro à fecundação pela Internet, tínhamos botecos (10 por habitante) e fábrica de camisinha natural, feita com matéria prima produzida por um cruzamento de bicha-da-seda com centopéia voadora, tínhamos vinaterias, cachaçarias, whiskerias, gimzerias, saquerias, rumiserias, conhaquerias, vodkerias, cervejarias e cervejerias, licorerias, camparerias, choperias, vermuterias e o escambauserias. Tínhamos (para feminilizar) a xana ao cubo, mas não uma universidade. Quando ponderamos pra Alguém que Pau Doce era uma praia, que o importante ali era vida mansa, descanso, rede bamba, batucadinhas mil, bebida pra cacete, belisquinhos e transinhas, vida de turista, enfim, ele nos deu um cala-a-boca, dizendo: “e uma universidade, não é exatamente isso? Claro que é. Daí, nossa vocação universitária. E universidade é um negócio que está na moda, cacete!. Nada mais certo pra fazer o camarada recompletar o ânus de dinheiro do que uma universidade”. Aí nossos olhos brilharam. “É o maior milagre da gandaia nacional”, continuou Alguém entusiasmado com a audiência, “a coisa funciona assim: o administrador não administra, o professor não ensina, o aluno não estuda, o diretor não dirige, o secretário não secretaria, feriados às pampas, se pintar uma greve de 6 meses ninguém percebe, e todo mundo fica feliz e todo mundo se forma e todo mundo tem lucro. Como? Milagre, segredo, sei lá”. Convencidos da lacuna em nossa estrutura funcional, resolvemos pôr as mãos à obra em prol da nossa, agora imprescindível, universidade. Primeiro, queríamos um nome. Alguém, novamente, lembrou (Alguém estava com o Capeta) que o quente no momento para nomear cursos superiores, (por mais inferiores que fossem), era começar por “Uni”. Uni-isso, Uni-aquilo, Uni-o cacete. O importante, mesmo que não fosse universidade coisa nenhuma, que fosse um simples cursinho de quinta categoria, eram as três letrinhas iniciais, o resto era detalhe. Claro que se o resto formasse com o Uni um conjunto interessante, melhor, ótimo, ponto pra universidade. Foi aí, nesse momento, que, antes que Alguém lembrasse de mais alguma coisa, o Lesma Lerda (irmão mais novo do Mesma Merda, mais novo, mas é a mesma merda) disse que conhecia, mais do que conhecia, era amigo íntimo de um tal de Aborda, por extenso, Abutre Calhorda (Abutre Calhorda não é, como o inteligentíssimo leitor pode estar pensando, o nome verdadeiro do personagem, mas um carinhoso apelido) que trabalha como corretor de nomes de universidades (faz, também, intermediação de outros nomes como de grupos criminosos, empresas privatizadas e igrejas carismáticas). Se o freguês desejar (desejar em dólar, evidentemente), junto com o nome, o Aborda vende o edifício, já povoado por alunos, professores, funcionários, com estoques verdadeiramente inesgotáveis de provas, todas devidamente respondidas e corrigidas. É possível, por exemplo, comprar uma universidade novinha em folha, zero quilometro, com cheirinho de carro novo, mas com uma tradição histórica de 30, 40, 50 anos, segundo o gosto verdinho do interessado. E se este quiser empregar todos os seus amigos como livre-docentes, mesmo os analfabetos de pai e mãe, a organização educacional já vem com os currículos prontinhos, faltando só sortear as matérias entre o bando e preencher os nomes, RG e CPF dos abnegados cristãos-novos da fauna universitária nacional. Aprovamos, eufóricos, a proposta e encarregamos o Lesma de convocar o Abrutre. Era o tipo do negociador de que nossa universidade necessitava. Dois meses depois, num recorde em se tratando do Lesma Lerda (se tivesse sido o seu irmão, como o leitor já sabe, não mudaria nada, seria o Mesma Merda), lá estava, no mesmo Esfola o Pinto (a futura sede da reitoria da universidade), o sacrossanto negociador de nomes. Foi só bater o olho nele e descobrimos o motivo de seu alado apelido. O nariz era tão adunco que qualquer arara ou periquito o chamaria de primo. Era um abutre. Calhorda ficava, com certeza, por conta de sua retidão de caráter e ilibada reputação (e putação também). Feitas as apresentações de praxe, cerimônia na qual algumas garrafas de destilados eram inerentes por definição, Aborda abriu sua maleta de vendedor e começou a desdobrar sobre a mesa do Esfola catálogos e mais catálogos com centenas de nomes de universidades. Começou mostrando algumas famosas que ele vendera recentemente, na velha tática, manjadíssima, de colocar água na nossa boca. Desfiou ante nossos olhos brilhantes, por exemplo, a Uni-versal (Universidade Verão em Salvador – que foi negociada –porteira fechada- junto com uma igreja do mesmo nome), Uni-cidade (Universidade da Cidade –qualquer cidade), Uni-med (Universidade de Mestres e Doutores), Uni-cover (Universidade do Comando Vermelho), Uni-ban (Universidade de Bangu 1), Uni-forme (Universidade For Men), Uni-sex (Universidade Sem Exames), Uni-sono (Universidade do Sono Noturno), Uni-tário (Universidade Taoista do Rio). E muitíssimas outras. Depois, entrando diretamente em nossa negociação, perguntou nossa opinião sobre o nome Uni-Pau. Achamos, todos, que o nome caia como uma luva, quase como uma camisinha. Porém, o Corvo, Corvo não, o Abutre nos alertou sobre os riscos desse nome quase ideal: o Direito Universitário, essa recente e importante especialidade do mundo jurídico, considerava grave dano patrimonial e moral a “homonímia presumida”, sobre a qual já abunda jurisprudência, caracterizada pela utilização de nomes diferentes, mas com sentidos passíveis de serem confundidos. Quando lhe dissemos que nos parecia que o nome UniPau dificilmente correria esse risco, ele nos desiludiu. Disse-nos que havia vendido algumas instituições que poderiam ingressar em juízo, alegando a “presumida homonimia” e citou suas mais recentes negociações: Uni-pinto (Universidade Pindamonhangaba de Tocantins), Uni-penis (Universidade Dr. Pedro Nicanor da Silva), Uni-bimbo (Universidade Bim Ladem é Bonzinho), para ficar apenas em três, mas havia outras. E havia, também, as de “correlação indireta”, tipificação também conhecida como “homonímia presumida invertida”, que poderiam, facilmente, dar a mesma dor de cabeça, como Uni-xana (Universidade Xavante-Nacionalista), Uni-periquita (Universidade Peripatética Quiminionista de Taumaturgia), Uni-xereca (Universidade Dr. Xerxes de Rebelo Carvalho) e Uni-Buçanha (Universidade Buçalar, Negocial e Habilitadora). Concordamos, então, que o risco de levarmos uma “homonímia presumida”, invertida ou não, pelas fuças era grande. Aceitamos, muito a contragosto, considerar outros nomes do inesgotável estoque do Urubu, quer dizer, do Abutre, para ver se haveria algum que correspondesse às nossas expectativas. E, aí foi um tal de Uni-praia pra cá, Uni-goró pra lá, e Uni-larica, Uni-festa, Uni-balada, Uni-birita, Uni-transa. Esgotamos todo o catálogo do Aborda e nenhum dos nomes nos agradou. Quando sentiu que poderíamos desistir de ter uma universidade paudocense e que havia o sério risco dele perder o negócio, passou a tentar nos convencer de que o risco de um processo judicial era praticamente zero, já que a justiça está sempre em greve e que, se algum dia ela voltar a trabalhar, o que é muito pouco provável, o número de processos será tão abundantemente grande que até, pelo menos, o ano 2300 nós estaríamos livres de qualquer citação. E nos convenceu. Acabamos entrando no seu argumento e compramos o pacote fechado. Prevaleceu UniPau. E compramos tudo: autorização definitiva do MEC, avaliação com nota A do Inep, título de doutor para toda a boemia de Pau Doce, todos os cursos integralmente gravados em vídeo e com imagens holográficas, provas já respondidas e corrigidas por computador, um enorme estoque de CD-room com pesquisas de ponta, todas inéditas. Os primeiros cursos a serem lançados serão os de “Engenharia Química com Ênfase em Bebidas Destiladas e Fermentadas”, “Psicologia do Sono”, “Medicina do Sono”, “Arquitetura do Sono”, “Mestrado e Doutorado em Sonoterapia”, “Pesquisas Avançadas com Canabis Sativa, Extasy e Viagra”, “Pesquisas Mais Avançadas Ainda sobre os Efeitos Positivos na Qualidade de Vida e na Longevidade do Uso Diuturno e Intensivo de Bebidas Alcoólicas”, “Curso Prático de Medicina – A utilização adequada e a habilidade no manuseio dos aparelhos reprodutores masculino e feminino”, “Antropologia Cultural: um sambinha é bom, comer é ótimo, mas beber e dormir é perfeito”, e “Pedagogia dos Jogos de Azar”. Tá tudo pronto, tá tudo dominado, agora é só esperar candidatos do Brasil todo virem fazer nosso vestibular, o mais onesto, cério, e ezigente do pais. Quem paçar em noço ezame e entrar na Uni-pau, será um aluno de tão auto níveu que não vai, jamais, levar pau. Quem vem pra UniPau, leva tudo, menos pau!

segunda-feira, 29 de novembro de 2010

39 O paudocímbolo

Plebiscito. Essa palavra mágica, tão atual, tão reverberada ao redor do mundo, brilhou para nós. A SOCIABAIXOPAUSOciedade dos CIdadãos ABAIXO de Qualquer Suspeita de PAU Doce – que corresponde à nossa Câmara Municipal, à nossa Assembléia Legislativa, à nossa Câmara Federal, ao nosso Senado e à nossa Turma do Deixa Disso, propôs a realização de um Plebiscito. Aplaudido delirantemente, foi aprovado por unanimidade, tanto na Sociedade como por toda comunidade paudocense. Ficou, porém, faltando, na brilhante proposta, para que ela pudesse se efetivar, já que nesta vida nada é perfeito, a decisão do assunto sobre o qual incidiria. Ninguém tinha a mínima idéia. Na medida em que os dias foram passando, a inquietação, a angustia, a aflição e, por fim, o desespero foi tomando conta de todos. A consulta já estava, legalmente, aprovada, a motivação e o entusiasmo eram enormes, não se falava em outra coisa, e nada de se achar um tema para ela. A maior dificuldade consistia na característica polêmica de um tema plebiscitário. Se não polêmico, ao menos, que permitisse alguma dissensão, ou mera discordância adjetiva, ou, ainda, se não houvesse alternativa, uma concordância desunânime. Mas, não. Em Pau Doce, não discordamos de nada, nem de ninguém. Dá muito trabalho discordar. Tudo pode, tudo é possível, tudo é permitido, desde que não canse. A nossa unanimidade unânime unanimíssima nos deixava de mãos atadas. Pensamos, em primeiro lugar, em nossa própria dificuldade como tema: “Seria bom, para Pau Doce, a total unanimidade? Sim ou não?” Porém, desistimos por temor a desmoralizar nosso Plebiscito, já que seria muito provável que o resultado fosse unânime em favor da unanimidade. Zero voto para o “não” e a totalidade para o “sim”. Desistimos da unanimidade. Outro tema que, num determinado momento, ganhou força sendo, depois, descartado, foi a proibição total e absoluta do trabalho em Pau Doce. Como tínhamos certeza de que a totalidade dos habitantes votaria a favor dessa proibição (já que não passaria de mera formalidade, pois, na prática, o trabalho aqui inexiste), desistimos, muito mais pelo risco que corríamos de ter que entrar em guerra contra o Brasil (com a certíssima neutralidade da Bahia), o que, paradoxalmente, nos daria muito trabalho (isola!), do que pelo medo de desprestigiar o Plebiscito, causa que vinha em segundo lugar. Outras idéias interessantes nos ocorreram, mas foram igualmente abortadas pelos mais diversos motivos: a proclamação da independência de Pau Doce, separando-nos do Brasil e criando a República Livre de Pau Doce (que já existe de fato); a suspensão do exercício de todas as religiões, fundando-se, em contrapartida, “O Nirvana Paudocense”; a proibição da ingestão, por maiores de 18 anos, de água pura; e outros tantos temas sérios, mas, de alguma forma, problemáticos. Depois de dois torturantes meses de frustração e debate, finalmente salvamos o plebiscito. A SOCIABAIXOPAU decidiu, sabiamente, aliás, que a questão a decidir não poderia ser relacionada com aspectos fundamentais e substantivos de nossa vida, pois, pela índole paudocense, toda mudança implica em trabalho e todo trabalho ou é imoral, ou é ilegal, ou emagrece, mas apesar de todas essas recomendações positivas nosso DNA não o suporta. Teria o Plebiscito que versar sobre algo simbólico e acessório. A sapientíssima decisão recaiu sobre a escolha de um símbolo que encarnasse a essência de Pau Doce. Tecnicamente, o Plebiscito não seria um Plebiscito, com um “sim” ou “não” como resposta. Estaria mais para uma consulta popular, com respostas em aberto, para que cada um escrevesse sua sugestão. Numa metodologia revolucionária, a proposta mais citada seria declarada a vencedora. Mas, para nós, não se tratava de consulta e sim de Plebiscito. Disso não abríamos mão. E, por mais que as respostas fossem livres, havia partidos e partidários. Com tudo o que esses estranhos ajuntamentos tem direito: claques, cabos eleitorais, boca de urna, comícios e outros bichos. Uns propunham, como símbolo, um enorme pau, um tronco de árvore, claro, do qual escorreria mel numa alegoria ao nome de nossa praia; outros, defendiam um pé-de-chinelo, velho e folgado. E a lista prosseguia: uma fruta-do-conde, e uma garrafa com o rótulo “Pinga do Pau Doce”, e um biscoito molhado, e um pescoço com um orifício, tatuado com as palavras “Papo furado”, e uma flor de papoula, e uma prato de arroz com feijão e... E muitos e muitos outros. Enfim, quando chegou o grande dia, a cidadania paudocense em festa, em gala e engalanada, foi às urnas. Fim do domingo, último voto depositado e a apuração teve início, já com o sol posto. Adentrou a noite, transpôs a madrugada, enfrentou a manhã, a tarde e a noite da segunda. Para encurtar a ladainha, no sábado à noite foi, enfim, encerrada. A comissão apuradora da SOCIABAIXOPAU, destruída por uma semana indormida, passada a votos e gorós (graças a estes conseguiram os bravos manter a vigília e a contagem), anunciou, afinal, o resultado. Venceu, por esmagadora margem, um símbolo que não havia sido candidato por nenhum dos partidos, um milagre do boca-a-boca, da intuição e sabedoria popular: o gato. O gato, mas não um gato qualquer. Venceu um gato específico, famoso mundialmente, amado, adorado, um semi-deus: Garfield. Sim, o super-star e o super-herói de Pau Doce. Ninguém mais Pau Doce do Garfield e ninguém mais Garfield do que Pau Doce. Sua volúpia, sua energia, sua hiperatividade totalmente nulas e inexistentes, coincidem “ipsis literis” com as nossas. O gato gordo, que dorme para viver, que prefere ver o mundo acabar a ter que se mexer, com um mordaz espírito crítico ferino, felino, que faz o Jon de idiota e o Odie de imbecil, que é um sumidouro de comida, esse gato, somos nós. Iguaizinhos, sem tirar nem pôr. Apenas, com algumas adaptações. Nosso Jon é o governo, nosso Odie, qualquer autoridade, qualquer regra, qualquer determinação, nossa comida é líqüida, nossa preguiça, a razão de viver. Garfield de Pau Doce. Nem Jim Davis imaginaria!

quinta-feira, 25 de novembro de 2010

38 Gingoubeus

Como é lindo o Natal em Pau Doce! Em primeiro lugar, porque é verão. E aqui o verão é verão-verão. Isso ocorre porque durante os doze meses do ano o verão não nos abandona. Nada de primavera, outono e, sobretudo, o inverno. Eterno veraneio. Mas, em dezembro! Em dezembro o bicho pega. Dezembro, Natal, verão. Ah, porque o Natal em Pau Doce também é em dezembro, por incrível que possa parecer. Claro, é em dezembro como em todo lugar. Como o leitor (que, em geral, é um desmemoriado) está cansado de saber, o Natal, no mundo inteiro, é comemorado em dezembro, no dia 12. Aqui também. E como é lindo nosso Natal! Apesar dos quase 70º centígrados, comum em nosso verão, nesse dia, invariavelmente, neva. Não pergunte, estultíssimo leitor, como nem por quê. O fato real, verdadeiro, inquestionável, é que, nesse dia, neva. Cai uma neve intensa, branca, gelada. E como o calor é brutal, a neve tem que ser abundante, já que tudo aqui abunda (em tudo há bunda). Toneladas e toneladas de neve autêntica e com firma reconhecida. Caso contrário, as bebidas esquentariam. Toda essa neve cai, diretamente, dentro dos copos dos paroquianos. E, sendo Natal, como em todo lado, aqui em Pau Doce também é uma festa religiosa. Religiosa e tradicional. Sendo religiosa, a bebida oficial é vinho de missa. Tonéis e tonéis de vinho vaticanizado, pasteizinhos de Santa Clara, pãezinhos de Santo Antonio, leitão a pururuca a João Paulo 2º, lagosta ao molho franciscano, picanha assada em fogueira da inquisição, papos de anjo, Martinhos Luteros ao roquefort... E, além de religiosíssimo, nosso Natal é tradicional. Papais-noéis às pampas. Papais-noéis saradões e anabolizados. Daqueles que só de olhar para eles já se sabe que presente estão trazendo. Olha-se o saco e já se vê o presente. Priminhas-noéis (não podem ser mamães pela ausência de celulite e pela grossura das coxas) ma-ra-vi-lho-sas(!!!), obrigando os mais deserotizados cidadãos a enrijecerem seus preâmbulos e intumescerem suas picardias. No dizer popular, levantam até defunto. E a tradição é mantida à risca. Os Papais-noéis entram pelas chaminés das casas, já com o saco na mão e tirando o presente para fora e as esposas, como sempre, ficam excitadíssimas com a introdução, enquanto os maridões, apesar da total inexistência de chaminés, acham normalíssimo. Os defensores dos animais e o clube GLS explodem de felicidade, pois as ruas ficam chapadas de renas e viadinhos. É lindo vê-los saltitando uns e cuspindo no chão outras, em plena renagem e total viadagem. Os sinos gemem, os esquilos coaxam e os besouros miam. Tudo na mais absoluta normalidade. As canções natalinas ecoam por todo lado. Aqui “bate o sino pequenino”, lá “Papai-noel já morreu”, mais além, “pobrezinho nasceu em Belém” um pouco pra lá de mais além “o sino gemeu” (incrível essa!). Mas, o mais importante em nossa natividade, o fulcro, o ponto e figura central é o grande Papai-noel de Pau Doce. Não se trata, é claro, dos já citados “macho-men” de saco vermelho na mão, invasores de lares falsamente enchaminezados. O verdadeiro Papai-noel de Pau Doce, primeiro e único, pouco ou nada, na verdade, nadíssima de nada tem a ver com o velhote comercializado no mundo inteiro. Idoso, gordão, barbona branca, oclinhos sem aro, vestido ridiculamente de vermelho com botas e cinturão pretos, sonorizado por uma risada medonha: Ôuh!Ôuh! Ôuh!Ôuh!Ôuh!Ôuh!Ôuh! O nosso não, só tem em comum, com essa figura esdrúxula, o nome. Para começar, o de Pau Doce é bastante jovem, um garoto mesmo, menino quase, não tendo mais de 75 anos, talvez até algo menos. Magro, magrinho, magérrimo. Botas pretas, combinando com o enorme cintão que lhe cinge a pança. Seus cento e poucos quilos são embrulhados por um conjunto de larguíssimas calças e uma batona folgada de cetim vermelho, com um filete de debrum branco acompanhando as costuras da bata. Na cabeça, decorada por uma longa barba branca e revolta e oclinhos redondos e sem aro, é coberta por um singular e ridículo – ridículo no sentido mais carinhoso possível – barrete com uma ponta branca que lhe chega até quase o ombro. Ele adora ouvir os pedidos das crianças às quais responde, invariavelmente, com uma sonora e agradável gargalhada: Ôuh!Ôuh!Ôuh!Ôuh!Ôuh!Ôuh!Ôuh! É um horror! Mas, por mais horroroso e cafona que ele seja, ele é nosso. Só nós o temos. E isso muito nos orgulha. Além do Papai-noel de Pau Doce, sui-generis, nosso Natal tem outra singularidade: temos aqui algo que a maioria das pessoas nunca viu e não podem sequer imaginar. Trata-se de uma réplica de uma cena bucólica, incrivelmente curiosa. Nela, na maioria das vezes de forma miniaturizada, há muitos personagens rurais com seus inseparáveis animais: carneiros, vacas, burros e até galinhas. Porém, o que lhe dá brilho invulgar, tornando-a uma obra sem igual, ao mesmo tempo, bela e chocante, é que, junto a essas figuras campestres, há, estranhamente, num verdadeiro “non-sense”, a presença de uns seres alados, meio andróginos, e outros ricamente vestidos, que insistem em introduzir no recinto, três camelões enormes, como se nossa zona rural fosse uma sucursal do Jardim Zoológico. Há também uma enorme estrela em posição absurdamente próxima ao solo, colocada sobre uma gruta onde estão postadas mais algumas pessoas e vários animais. Essa cena, não é como pode parecer ao apanacado leitor, única. Por exemplo, montada numa praça, ou outro lugar público. Não, nada disso. Existem centenas de réplicas dessas cenazinhas. Nas casas, nas praças, nas escolas, nas igrejas. Nenhuma exatamente igual à outra, mas todas muito semelhantes. E a cada ano, as pessoas vão agregando mais bugigangas e penduricalhos. E elas desaparecem, como por milagre, uma semana depois do Ano Novo, para reaparecerem, invariavelmente, no Natal seguinte. É incrível. Até hoje, por mais que pesquisemos, não conseguimos saber de onde se originou essa estranha tradição, única em nosso Natal. Só em Pau Doce mesmo!

sábado, 20 de novembro de 2010

37 S’eu cozinho, eu não lavo

Meu grande amigo de Sampa, Tolomeu Bartolo, o Tolo, resolveu seguir meu exemplo e vir se instalar em Pau Doce. Também, como eu, de extirpe nobre, compartilhava comigo a prática do mesmo esporte olímpico: a alta pilantragem noturna. Considerava-se muito jovem para sair de casa e ter vida independente, mas seus pais não concordavam com seu ponto de vista. Em especial, seu pai, o Conde Vivomeu Bartolo, o Vivo, um milionário de coração empedernido e que sempre demonstrou pouco afeto por seu filho único (a partir do nome que lhe deu), e exige que ele, praticamente ainda adolescendo, se estabeleça por conta própria. Quer que essa verdadeira criança torne-se independente. O velho Vivo afirma temer pelo futuro do filho, caso venha a morrer, já que está se aproximando dos 90 anos. É um blá-blá-blá sem sentido. Pobre Tolo! Acho que ainda nem tirou a carteira de motorista. Mas, fazer o quê? Como ele soube de minha vinda para Pau Doce e pressionado a fazer vida própria, veio para cá também. Com a grana do velho e por imposição dele, resolveu montar um bar. Mais um aqui na praia. Mas, aqui, um bar a mais nunca é de menos. Um bar a menos é que seria demais. Discreto e humilde como sempre, resolveu dar seu próprio nome ao estabelecimento. “Bar Tolomeu Bartolo, meu”. Explicou a adição do possessivo ao final, porque não resistiu à sonoridade do eco. Ficou lindo! A inauguração coincidiu com o dia de seu aniversário de 35 anos. Grande festa, grande noitada. Gandaia das boas. Passada a efeméride, Tolomeu resolveu fazer do Bar Tolomeu um centro de referência da culinária paudocense. Situação extremamente interessante, pois ele, recém-chegado, desconhecia por completo a culinária de Pau Doce, que, por sua vez, nunca existiu. Assim, o cara-de-Pau Doce foi obrigado, com nossa ajuda – aquela meia-dúzia de 3 ou 4 de sempre – a inventar a antiga e tradicional culinária paudocense. Antes, porém, discutimos se o estabelecimento seria temático. Chegamos à conclusão que em Pau Doce todos os bares são temáticos, tematizados com os temas que nos são caros, consubstanciados nos famosos 10 Mandamentos, trazidos, há muito tempo atrás, por Moisés (da farmácia), que os encontrou impressos num bloco de pedra, depois de um mês perdido no Monte Sinal (ao menos foi essa história que contou para a mulher, quando reapareceu, sujo, sem a dita pedra que ele afirmava ter encontrado, com marcas vermelhas lambuzadas no rosto e na camisa e cheirando a uma estranha mistura de cachaça com perfume barato). A mulher, que, de início, desconfiou da história – já que Monte Sinal é, de fato, uma montanha que fica na serra atrás de Pau Doce, Paúba e Maresias, com o formato de um ponto de interrogação, mas, coincidência ou não, é também o nome de um puteiro de 5ª categoria em São Sebastião – xingou Moisés de “filho da puta” pra cima (ou pra baixo), ameaçou ir embora levando consigo os 8 filhos, tentou arregimentar as amigas para irem, com ela, a São Sebastião arrebentar a casa das quengas, mas acabou amansando e tornou-se a maior divulgadora do Decálogo de Pau Doce, que é mais ou menos o seguinte (mais ou menos, porque há varias versões levemente discrepantes):


1º- Jamais trabalharás.
2º- Só tomarás água na infância ou na doença.
3º- A manhã foi feita para dormires.
4º- Nunca permitirás que profanem o sagrado recinto do Bar.
5º- Ânus de alcoólatra terá proprietário, que será, obrigatoriamente, o
próprio portador.
6º- O único suor digno é o do descanso sob o sol.
7º- Todo cônjuge terá direito divino a folgas sabáticas (de um ano)
todos os anos, se assim o desejar.
8º- Só casarás como último recurso à sobrevivência.
9º- Repudiarás, como traidor, todo aquele que se deixar seduzir pelo
trabalho.
10ºSerão considerados sinais de santidade: o coma alcoólico e a
cirrose hepática.

Assim, descartamos a opção temática. Fomos aos nichos. Por sexo, por idade, por profissão... Descartamos todos, já que por aqui pululam todos esses nichos. A decisão final recaiu, depois de tanto debate, sobre a idéia original: o “Bar Tolomeu Batololo, meu” seria especializado na “tradicionalíssima” culinária paudocense. E como essa não existia, nem havia existido jamais, tudo o que fosse novo, estranho, esquisito e revolucionário, caberia no cardápio da casa. Bastariam criatividade e audácia. E, então, coletivamente, entre um pifão e um pileque e, sobretudo, durante cada um deles, fomos compondo essa maravilhosa cozinha, cuja fama de excelência, hoje, tão pouco tempo depois de ter sido criada, espalhou-se pelo mundo. Há turistas de toda parte: da China, do Ceilão, do Havaí, da África do Sul, da América do Leste, da Europa Equatorial, dos Estados Unidos do Zimbábue, que acorrem a Pau Doce pelo simples renome da Cu-de-Pau (que é como ficou conhecida a “CUlinária DE PAU Doce”). Para que o desinformado leitor tenha uma parca idéia desse universo de sabores, eis alguns dos nossos pratos: “Curintiano” (salada de arroz branco com guisado de feijão preto); “Xinxumbunga de Paragantunga” (mix de todos os ingredientes que estiverem sobrando na geladeira do estabelecimento); “Pinto mole não entra” (galináceos jovens de carne rija – os de carne tenra são descartados – curtidos em vinho branco por duas semanas e flambados à vista do cliente); “Grangrena” (GRANdes GRElhados NArcotizados: perus grelhados na folha de coca); “Feijão emporcalhado” (o famoso legume vai acompanhado de cortes selecionados de carne suína: orelhas, rabinho, pés, toucinho e lingüiça); “Um dia de cão” (salgadinhos recheados de pimenta malagueta e coentro); “Safadinha gostosa” (salada de alface safadinha e queijo provolento); “Toillet masculino” (rins bovinos temperados com ácido úrico tri-filtrado); “Biscoito anal” (biscoitinhos de polvilho com formatos dos algarismos correspondentes ao ano em curso); “Piranhas do Egito” (o famoso peixe ao forno, adornado com tâmaras); “Arca de Noé” (guisado de carne bovina, suína, caprina, galina e peixina); “Xanadu” (vulva suína adubada com molho Roquefort); “Cala a boca!” (doce puxa-puxa de açúcar queimado); “Nosferatu menstruou” (chouriço de sangue bovino talhado por molho de sangue suíno); “Pura que o patiu” (grogue de cachaça pura com meio patiu de mandioca); “Lulinha paz e amor” (calamar com um dos tentáculos cortado, com língua presa por capim barba de bode); “Merdalhão” (medalhão de filet-mignon lambuzado com creme a escolher); “Axé-music” (glúteo de vaca e testículo de touro); “New-sertanejo” (feijão tropeiro liquefeito servido em chifres de boi) e tantos outros pratos maravilhosos, como: “Não põe a mãe no meio”, “Senta que o leão é manso”, “Aqui ó!”, “Cru-de-ferro”, “Nó em pingo d’água”... Ficou ou não ficou uma maravilha a nossa Cu-de-Pau?

domingo, 14 de novembro de 2010

36 Esculpindo alimentos

Muitos dizem que cozinhar é uma arte. Conhecida no mundo fashion por cozinharte. Há os que afirmam que, mais do que cultura, a preparação de alimentos exige amor, dedicação e trabalho. Talvez, esta última razão explique o fato de eu sempre ter odiado a cozinha. Nojo é a palavra mais certa. Quando descobri que os alimentos não apareciam do nada, já prontos para serem consumidos, e que eram preparados em locais especiais, senti nojo. Antes de chegar a Pau Doce, isto era algo que sequer existia para mim. Era como se eles, os alimentos, estivessem prontos desde sempre. Só se materializavam na hora em que os via na minha frente. Na mansão em que morava quando criança com minhas babás (mamãe estava sempre viajando), não havia cozinha. Era o que eu achava. Se existia uma, eu nunca a vi, nem nunca nela entrei. Na mansão da adolescência, idem. E, quando já adulto, na terceira mansão, também a cozinha inexistia. Mamãe, mesmo ausente, sempre me proveu de tudo. E minhas babás, empregadas, mucamas e aias faziam a comida se materializar na minha frente, e pronto. Teus, também, muito contribuiu, com sua insondável divina grana, para minha virgindade culinária. Só depois de chegar a Pau Doce, muito depois, é que comecei a conhecer os segredos da cozinha. O primeiro prato que aprendi a fazer foi pão com manteiga. Apesar de toda a minha natural resistência, meus amigos acabaram, praticamente, por me obrigar a essa primeira aprendizagem vergonhosa: ou eu, dali por diante, aprendia a passar a manteiga no pão, ou passaria a comer pão com pão. Apesar da minha repulsa visceral – afinal, passar manteiga no pão não deixa de ser uma modalidade de trabalho, tão vergonhosa quanto qualquer outra – a constatação de que eu não mais iria ver a manteiga derreter no pão quente, falou mais alto. Durante um mês, com enorme força de vontade, procurei dedicar-me com afinco a essa aprendizagem. Não foi fácil. Noites e noites, acordei suado e ofegante, após terríveis pesadelos, nos quais eu morria afogado em rios de manteiga, ou era ridicularizado nas ruas de Pau Doce, como se eu, de fato, estivesse trabalhando. Afinal, aprendi a fazer este sofisticado prato de nossa culinária. Primeiro, abre-se o recipiente que contém a manteiga (lata, pacotinho ou embalagem plástica); depois, com muito cuidado (em se tratando de pão francês), com uma faca de lâmina serrilhada, abre-se uma fenda do lado direito do pão no sentido de seu comprimento, levando-a até o lado oposto transformando-o em duas metades iguais; a atenção do cozinheiro deve voltar-se nesse instante para a fonte de manteiga: aí, usando uma espátula, ou faca lisa, ou, não havendo outra forma, a mesma utilizada para abrir o pão, com cuidado para não penetrar com muita profundidade na pasta (que deve estar a temperatura ambiente, jamais resfriada) retirando dela, se possível com um movimento da direita para a esquerda, uma porção com cerca de 5 gramas; a última etapa deste saboroso prato é da maior importância para o resultado final: tomando-se na mão esquerda, a metade inferior do pão, deve-se espalhar a manteiga recém retirada de sua fonte, no sentido longitudinal, suavemente, com o mesmo utensílio que a esteja portando, se possível, obedecendo a mesma direção anterior, ou seja, da direita para a esquerda. As operações de retirada da porção de manteiga e a de sua colagem no pão devem ser repetidas quantas vezes se fizerem necessárias para completar a sobreposição de toda a área interna do receptáculo. Depois de terminada a manteigalização da primeira metade, todo o processo deve ser reproduzido, de maneira idêntica para a cúpula do pão. E aí, depois de todo esse trabalho, se ao cristão ainda sobrarem forças e apetite, ele poderá saborear essa sofisticada iguaria. Uma vez deflorado com carinho, quer dizer, uma vez decorado o caminho, tudo ficou mais fácil. Onde passa um boi, passa uma boiada. O meu segundo prato foi a adoçação do café. Durante toda a minha vida, eu seria capaz de jurar que café era uma bebida doce, como o licor. Jamais me passou pela cabeça que fosse necessário adoçá-lo. Quando descobri essa tragédia, resolvi não mais tomar rubiácea se estivesse sozinho, sem ninguém para açucará-la para mim. Porém, após o aprendizado da manteiga, acabei por sucumbir também no café. Daí por diante, não parei mais. Fui aprofundando minhas habilidades de gourmet. Por exemplo, aprendi a fazer cubos de gelo. Essa tarefa, totalmente nova para mim, de transformar água líquida em água sólida, foi revolucionária. Nunca imaginei que fosse possível fazer tal operação fora das linhas de montagens das fábricas de gelo. Produzir gelo na própria residência ou estabelecimento comercial do paisano, na sua geladeira ou freezer? Incrível. Confesso que ainda não dominei, totalmente a técnica de gelificação, mas, na maioria das vezes que tento, me saio bem. Que incríveis mistérios não contém a natureza! Só a maturidade nos permite desvendá-los. O amendoim, por exemplo. Descobri que o abençoado amendoim não é, em sua forma original, como sempre pensei que fosse, da forma que sempre me foi servido. Uma castanhazinha pequenina e amarelada, ou às vezes, quando já idosa, coberta por uma pele escura. Para meu espanto, descobri, recentemente, que ele, o amendoim, vem embalado de fábrica num invólucro estranho, como um casulo de palha seca, contendo lóculos que abrigam os grãos (amendoins são grãos, me disseram). Superei este outro desafio e já domino a complicada técnica de produzir o amendoim livre do seu invólucro. Com a chegada da comida congelada a Pau Doce, aprendi a fazer pizza, nugets e lazanha. Claro que jamais fiz qualquer desses pratos. Sempre há, na roda, alguém disposto a fazê-los. Mas, eu tenho alguma idéia de como se opera para produzí-los. Estou me preparando, agora, para o grande salto à frente. No ano que vem, quero estar em condições de começar a aprender a fazer um dos pratos mais deliciosos da culinária universal: o ovo frito! E com gema mole. Vulgo “zoiudo”. Claro que quero aprender a fazê-lo em seus mínimos detalhes e em toda a sua sofisticação. Mas, só teoricamente. O que, aliás, já é outro vergonhoso trabalho. Te cuida lobisomem!

terça-feira, 9 de novembro de 2010

35 Hincha pelota!

Todo verão é a mesma coisa. Invariavelmente, mal começa dezembro, e alguma praga se abate sobre Pau Doce. Já tivemos pragas dos mais variados tipos, de bichinhos pequenos a médios e grandes; de aéreos a terrestres e marinhos; alguns mais agressivos, outros bastante passivos. Ano a ano, toda uma fauna. Houve verões em que dominou a Lacerdinha, inseto muito pequeno, pouco maior que uma pulga, pretinho, que enxameava os arbustos das ruas e jardins. Onipresentes nos anos 60, saltavam sobre o desavisado passante e quando atingiam os olhos, a vítima sentia um queimar agudo e passageiro. A Lacerdinha leva esse curioso nome popular porque, além de ser extremamente irritante e dar a impressão de estar em todo lado, como o exuberante tribuno carioca cognominado “o Corvo”, segundo alguns entomologistas, ela era gerada e nutrida pelo “alitum lacerdarum”, quer dizer, pelo respirar, pelas palavras e pelos discursos do próprio Carlos Lacerda. Com o falecimento do famoso político, elas desapareceram de todo Brasil, com exceção de suas esporádicas visitas estivais a Pau Doce. Tivemos outros visitantes. Num verão, foram os Piripipis, pequeninos voadores em formato de guarda-chuvas abertos, que desciam suavemente aos milhares como miniaturas de pára-quedistas. Noutro, os Carpintchos, lagartixas de 18 patas e 2 rabos. Vieram, também, os Pinica-pinto, peixinhos de um centímetro de comprimento, especialistas em mordidinhas nas pernas – várias – dos banhistas, como se fossem beliscões. Ano passado, tivemos as Traças Voadoras, primas dos Cupins Alados, com a mesma capacidade de seus priminhos pentelhos para entrar na boca das pessoas e cair nos pratos de comida. Tal é a inexorabilidade dessa invasão sazonal, variando sempre o tipo de invasor, que temos uma Casa de Apostas dedicada, integralmente, ao Jogo do Bicho, que aqui em Pau Doce nada tem a ver com a conhecida loteria de números associados a animais, consistindo na efetuação de apostas sobre qual será a praga do próximo verão. A dificuldade da administração dessa modalidade de jogo reside no fato dele possuir uma gama ilimitada de possibilidades: em princípio qualquer animal, sobretudo os pequenos alados, são candidatos a protagonistas do próximo verão. Este ano, por exemplo, periga não haver qualquer vencedor, já que a praga de turno era totalmente inesperada. Pau Doce foi invadida por um enxame de turistas argentinos. De que praga se tratará? Deverá estar se perguntando o obnubilado leitor. Tratar-se-á de insetos carnívoros? De roedores bailarinos? De alguma bactéria que cause incômoda irritação? Não, jejuno leitor, turista argentino é uma subespécie (subdivisão da espécie) de homo sapiens (no caso, homo milongueirus), que habita um vasto nicho ecológico ao sul da América do Sul, onde sobrevivem comendo vísceras de animais e bebendo uma estranha mescla de vinho com erva mate, sendo descendentes de espanhóis que falam como italianos e se consideram britânicos. Há, neste verão aqui em Pau Doce, turistas argentinos saindo pelo ladrão. Não se fala mais paudocês como sempre. Só se ouve, por todo lado, “che boludo!” “pelotudo de mierda!” e “hijo de mil putas!” No Bate-coxa e no Espreme Saco, duas das melhores casas de danças que temos por aqui, os ritmos brasileiros foram expurgados. Domina o tango. Todo sanfoneiro caiçara virou bandoneonista. Pelas ruas assobia-se “Cambalache” e “Mano a mano”. Nos botecos, o samba cantado até o amanhecer, foi substituído pela “zamba”, que o cavalheiro dança tentando envolver a dama com um lenço e do qual ela finge fugir ou simula se mandar. E a caipirinha? E a purinha? E o caju amigo? E a batida de maracujá? E o rabo-de-galo? E a pinga com fernet? Tudo, tudo foi substituído pelo mate amargo. Estamos tomando cachaça como o gaúcho toma chimarrão: chupando no canudinho de prata. Ao invés da cerveja, vinho. Vinho tinto de 18º, marcas Toro e Facundo, que os boludos trazem na bagagem, não em garrafas, mas em caixinhas como as de leite. Sábado passado, no Amansa a Jeba, barzinho perto da praia, ao lado do Pinico Também é Panela, dois gringos foram hospitalizados, na verdade, posto-de-saudelizados. Tudo porque, no auge do quilombo, um deles resolveu gritar: “Viva Perón, carajo!” No que o segundo, atirando-se sobre o peronista, contestou: “Perón es la puta que te parió!” Num minuto, era pedaço de orelha de portenho por um lado, dente canino de entreriano voando por outro. E não houve outra solução melhor do que recolher o que restou dos dois e mandar para o Posto de Saúde. Os que sobraram, resolveram celebrar a paz, inclusive aprofundar a velha e maravilhosa amizade entre eles e nós. Surgiram até duplas mistas de cantores como Gardel Rosa, Carlos Noel, Airton Fangio, Néstor da Silva, Maradona do Nascimento e Peladona. Para selar a amizade entre Brasil e Argentina, resolvemos promover um jogo de futebol (na praia ao lado, que aqui o futebol é proibido) entre os dois paises. Houve 32 jogadores internados no Hospital Municipal de São Sebastião. Onze em estado grave. Infelizmente o verão está acabando e a praga desse ano, que lastima, ya se vá. A la puta que los parió, carajo!

quinta-feira, 4 de novembro de 2010

34 Pluviometricidade aguda

Faz já dias e dias que está chovendo. Aliás, estamos discutindo Micoim, Bigorrilho, Meio Quilo, Pilha Fraca, Lexotan e eu há quanto tempo não para de chover. Micoim fala em 32 dias, Bigorrilho diz que não passam de 27, seis meses e meio é a afirmação do Meio Quilo, o Pilha Fraca abaixa esse tempo para a metade, o Lexotan jura não se lembrar de quando viu o sol pela última vez e eu, o mais comedido e equilibrado, fico com modestos 19 dias. O fato é que meus 19 dias foram um chute total, apenas para ficar com o número menor. Na verdade, como o Lexotan, também não faço a mínima idéia de quando o céu começou a despencar em cima de Pau Doce. Tenho certeza que os outros quatro pinguços, pinguços não, pelo amor de Deus, aguardentólatras, estão chutando como nós e não têm qualquer noção do que estão falando. A impressão mesmo é que Macondo baixou em Pau Doce. Chove de tudo quanto é lado, não apenas de cima para baixo, como seria o normal, já que o vento leva as gotas para onde quer, até para cima. O único som que se ouve é da água caindo e do vento dançando nas árvores. O barulho do mar, sempre tão presente, desapareceu. Os sons humanos sumiram. O dos animais, terminou. As raras pessoas nas ruas parecem sombras, os cachorros, mesmo os mais peludos, são como lontras molhadas, nem os gatos estão secos. E a nós, os cidadãos de honra e respeito, só nos resta fazer o que só fazemos quando não tem outro jeito: jogamos conversa fora e enchemos a cara. Claro que sempre fazemos o possível para que a situação não tenha jeito. E para que os proprietários dos serviços de utilidade pública essenciais não reclamassem, foi programado um percurso por todos eles, semana a semana. Nesta, já estivemos no Café Coado, no Piolho no Barro, no Chaveco de Gaveta, no Macaxera com Chantilly, no Bar Bicha e hoje estamos acampados no Sans Chupança, aquele em que “sóbrio não entra e bêbado não sai”. Aqui, sob a regência da proprietária Glória de Pau Doce, estivemos tomando soro destilado de baixa graduação na veia e discutindo. Não discutimos apenas se já houve algum dia sem chuva por aqui, se ela é, de fato, eterna, ou se estamos com a memória fraca; ainda que este tema fosse o dominante, falamos também sobre outros assuntos. Por exemplo, acabamos de discutir sobre o casamento civil de homossexuais, tema, com certeza, ensejado pelo clima do Sans. Em verdade, tecnicamente falando, não houve discussão, já que todos somos favoráveis à união, com exceção do Lexotan, que não conseguiu se lembrar, por mais que tentasse, o que queria dizer homossexual. Teimou que era um tipo de equipamento para cortar madeira, como uma serra elétrica. Como não conseguimos demovê-lo, descartamos sua insistente e cortante opinião. Concluímos, por unanimidade, semi-unanimidade (a serra elétrica!), que o que deveria ser proibido era, sim, o casamento tradicional, entre homem e mulher, já que este tem objetivos muito pouco defensáveis, egoístas e antropocêntricos. O principal deles é a geração de filhos, multiplicando no planeta essa raça de exterminadores, de poluidores e de predadores, criando pencas e pencas de crianças que, em sua maioria, crescerão e gerarão outras tantas pencas e pencas, num assustador crescimento geométrico: 28 milhões em 1500 aC., 170 milhões no início da era cristã, 400 milhões por volta de 1500 dC. e mais de 6 bilhões hoje. Fosse abolido, terminantemente proibido, o casamento heterossexual, responsável pela institucionalização do parto legal, e o número de nascimentos cairia fenomenalmente a padrões mais aturáveis e dignos, já que as fecundações dos óvulos pelos espermatozóides ocorreriam em relações livres e eventuais. Importante pesquisa, patrocinada pela ONU, produzida por cientistas da Universidade Nacional da Terra do Fogo em colaboração estreita com professores do Instituto Mao Tse Hitler, com sede em Guaribas, PI, chegou à conclusão que 95% das relações sexuais entre casais formalmente constituídos ocorrem desnecessariamente, já que um dos dois ou, ambos, não estão interessados, nem motivados para o ato. Porém, são culturalmente pressionados. Um, mesmo não querendo, acha que o outro quer, o que, de forma alguma, é verdade. O homem teme por sua masculinidade. A mulher sofre por sua feminilidade. Ele se sente obrigado e ela obrigada se vê. Se a algum dos dois for perguntado, pelo outro, se deseja o conluio carnal, a mentirosa resposta será, quase invariavelmente, sim. O “sim” é para não melindrar ao que perguntou, que, em principio, deve querer, mas que só inqueriu por desencargo de consciência. Do total de filhos gerados, ainda segundo a pesquisa, 99,98% o são pelos 95% das relações não desejadas. Se os casais casados não fossem casados, só relacionar-se-iam sexualmente quando, de fato, estivessem motivados. Não morando juntos, não dormindo na mesma cama, tendo que pagar motel, tendo que ter o mesmo tempo livre disponível, as relações não totalizariam os restantes 5%, mas cairiam para mínimos 1,03%. Este é um índice razoável, mais condizente com o que a natureza sonhou para a espécie humana, longe, por exemplo, dos ratos urbanos que copulam 20 vezes por dia. Bigorrilho argumentou, brilhantemente, que muitas religiões, que se dizem divinamente inspiradas, proíbem seus sacerdotes e sub-sacerdotizas de se casar, obrigando-os ao celibato perene. Por alguma razão sábia o farão. Aplaudimos de pé o fecho de ouro de nossa discussão. Glorião, felicíssima, liberou bebida grátis pra todos. Tomara que a chuva não pare nunca mais...

sábado, 30 de outubro de 2010

33 Enfim, um hino não é um hino (dois)

É possível que algum leitor mais apanacado que o normal - o que é muito difícil, mas não impossível - tenha achado alguma semelhança entre o razoável, quase sofrivel, Hino Nacional Brasileiro e essa esplêndida exuberância inigualável que é o Hino de Pau Doce. Até aí, tudo bem. É possível mesmo que possa haver algo de um que lembre o outro, (já que, como salientei na Itinerância anterior, todos os hinos ou são quase idênticos ou não são hinos), mas jamais Pedouro, o Duralágio, não, Pelágio, o Duradouro poderá ser acusado de plágio (apesar do seu nome sugerir essa possibilidade). Estudos aprofundados efetuados pelo renomado Instituto Histérico e Pornográfico de Pau Doce, que, devido ao excepcional cuidado e extrema competência dos pesquisadores – os ditos porno-histéricos - alongaram-se por várias décadas, consumindo, não um caminhão de dinheiro, mas um comboio inteiro, de verbas nacionais e internacionais, (todas verdinhas, verdinhas), chegaram à conclusão, exatamente oposta. Após penosas consultas a históricos alfarrábios, betarrábios e, até, gamarrábios, todos muito bem acondicionados e preservados - com o auxílio de indispensáveis colônias de traças e voracíssimas populações de cupins, animais sabidamente preservacionistas e indispensáveis para a manutenção de guardados antigos, em especial, de papel e madeira – no falecido arquivo do Município de São Sebastião, comprovaram ter Pelágio concluído sua consagrada sinfonia – apenas a música – no ano de 1821, deixando para compor a letra algum tempo depois (esperou baixar a inspiração), por volta de 1908. Ora, qualquer ignorante e idiota sabe, com certeza, e é possível (pouco, é verdade) que até o leitor também o saiba, que o Hino Nacional Brasileiro teve sua música composta (certamente copiada) em 1822 e a letra (chupadíssima) em 1909. Assim, o pouco original Hino Nacional Brasileiro é muitíssimo mais jovem que a obra-prima paudocense. Despeitadíssimos familiares descendentes dos compositores do clone do nosso hino, os insignificantes e inexpressivos Francisco Manuel da Silva e Joaquim Osório Duque Estrada, tentaram inverter o jogo e enlamear o respeitadíssimo nome do Mestre Plágio, ao acusá-lo de ser ele o autor do pelágio, quer dizer, de Pelágio ser, não o plagiado, mas o plagiário. Com suntuosos subornos conseguiram cooptar criminosamente o Instituto Histórico Nacional, o Museu da Casa Brasileira, a Academia Brasileira de Letras, a Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência, a Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo, a Conferência Nacional dos Bispos do Brasil, a Associação Brasileira de Inventores, a Casa do Poeta Brasileiro, o Conservatório Nacional de Música, o Conselho Mundial das Igrejas (setor Brasil), a Associação Médica Brasileira, a Escola Superior de Guerra, a Associação dos Magistrados Brasileiros, o Movimento Nacional dos Trabalhadores Sem Terra, a Confederação Brasileira de Futebol, o movimento internacional dos Confeiteiros Sem Fronteiras, a Câmara Brasileira do Livro, a direção do Teatro Municipal do Rio de Janeiro, a Associação Nacional dos Trabalhadores na Indústria do Turismo Sexual, a Confederação Geral do Trabalho, o Instituto Rio Branco, o Sindicato Nacional dos Heróis de Histórias em Quadrinhos, a Central Única dos Trabalhadores, a Confraria Brasileira dos Devotos de São Longuinho, a Confederação Nacional da Indústria, a Associação Brasileira de Defesa do Mercado de Trabalho das Prostitutas, dos Sacoleiros e dos Vereadores, a Associação das Escolas de Samba de Aparecida do Norte e mais 839 assinaturas de associações autodenominadas nacionais, brasileiras e o escambau. Todas tão inexpressivas quanto ás citadas no rol acima. Claro que os dirigentes da diretoria do IAGAPEPEDE (Instituto Histérico e Pornográfico de Pau Doce) e seus membros (os membros do Instituto, não dos dirigentes, bem entendido) não deram a mínima pelota aos puxa-sacos de Francisco Manuel e Joaquim Osório. Mas, como a insistência foi muito grande e o loby enorme, foi necessário apelar para instâncias internacionais, dessas que não se impressionam com o tamanho do loby. Iniciamos – o Instituto Histérico...etc – com um pleito (enorme também) ao Conselho de Segurança da ONU. Já que a questão era apelar, fomos direto pras cabeças. Como esse conselhinho, que se reúne quando quer, estava demorando para responder e nós não estávamos a fim de ficar esperando eternamente, peticionamos ao Parlamento Europeu, que para alguma coisa deve servir. Os europeus, por sua vez, são mais devagar que os bahianos – só não ganham de nós, os paudocenses, é claro – desistimos e apelamos para a Associação Internacional dos Compositores de Bolero, Mambo e Chá-chá-chá (evitamos a Associação Internacional de Compositores de Hinos, pois soubemos que ela estava já comprometida com os nossos inimigos). Como, ainda uma vez, a resposta tardasse, batemos à porta da renomada, insuspeita e incorruptível Associação das Famílias Sicilianas, também conhecida como Movimento Associativo das Federações Internacionais de Amigos. Finalmente, batemos na porta certa. Descobriram, os pesquisadores da M.A.F.I. A., que a melodia do Hino de Pau Doce é muito semelhante, digamos quase igual, a uma marcha composta no ano 261 aC, durante a Primeira Guerra Púnica (que o indigente leitor se abstenha de tentar fazer qualquer trocadilho de mal gosto com o nome da guerra, por favor), pelo próprio Pelágio, o Duradouro, para ser executada durante uma das batalhas da flatulenta guerra. Assim sendo, ficaram os senhores Francisco da Silva e Joaquim Estrada e seus sequazes, totalmente, desmascarados. É muito provável, que depois dos resultados desta demanda, o governo brasileiro decida derrogar o atual Hino Nacional Brasileiro, já que é um reles plágio. Analistas vêem grande chance da escolha do novo hino recair sobre a composição do Mestre Duradouro. Assim, não seria necessário ensaiar uma canção patriótica diferente: a melodia é praticamente a mesma. E a letra? Bem e a letra, tanto faz, já que nem a Seleção Brasileira sabe a atual de cor. Fazer o quê?

segunda-feira, 25 de outubro de 2010

32 Um hino é um hino, é um hino, é um hino (um)

Por volta do ano da graça de mil oitocentos e alguma coisa, aportou nesta praia, segundo seguríssimos registros históricos, competentemente preservados no pingódromo do Bar do Zé, vindo lá das Guerras Púnicas (evidentemente, perdeu-se no caminho e vagou pelos oceanos durante fugazes e miseráveis 2200 anos), o ex-combatente, regente de fanfarra e fanfarrão empedernido, Pelágio, o Duradouro. Consta que no ano 300 aC, Dura já era bem rodado, tendo sido maestro de inúmeras e incontáveis bandas, a ponto de ser conhecido em Cartago, como o Rei do Coreto. Em aqui chegando, no citado ano da graça, Douro, depois de um belo e reconfortante banho, de sol, e, após ter se inteirado de como funcionava o galinheiro, candidatou-se ao cargo de Diretor Musical da Banda Marcial de Pau Doce. Diante do inexorável fato da inexistência de tal agrupamento artístico e não havendo, ainda, aqui músicos executantes de instrumentos bandísticos, como clarim, trumpete, trombone, baixo-tuba, gaita a laser e órgão masculino, alguns, à época, sequer ainda inventados, nosso jovem macróbio, resignou-se a receber seu salário marajaístico - que já no século XIX a maracutaia era servida como prato do dia - e curtir a praia e as morenas e as loiras novecentistas. Mas, para não ficar com a vasta batuta abanando e evitar ser motivo da maledicência popular endêmica, resolveu edificar (e até, por vezes, ediir) o Hino de Pau Doce. Como todo bom hinólogo, Estável, Estável não, Duradouro, mais do que um exímio compositor era um excelente copiador. Existe algo mais igual a um hino do que outro hino? Qualquer hino. Se os arqueólogos musicais encontrarem em suas escavações sonoras, dois hinos diferentes, só há duas possibilidades aplicáveis ao caso: 1ª: um dos dois não é hino; será samba, maxixe, rebolado, cantiga de roda, solidó, tango-rock, valsa cearense, ou o que quer que seja, menos hino, ou 2ª: nenhum dos dois é hino. Um hino para ser hino mesmo, não pode ser, digamos, igual, igualzinho aos demais hinos, o que seria um evidente exagero e uma malediscência contra esse gênero pré-musical, quase musical, protomusical, que tanto emociona os conservadores e provoca orgasmos cívicos nas madonas quatrocentistas, ou nas madistas quatrocentonas. Um hino não é, nem pode ser igualzinho aos demais, não, nunca, jamais. Ele deve ser e, sem dúvida, será apenas idêntico. Por exemplo, suas introduções instrumentais devem ser sempre:

Parâm/param/pam-Parâm/param/pam-Parâm/param/pam-Pam

Pam-Parâm-Parâm-Parâm-Parâm-Parâm-Pam

Parâm/Param/Pam-Parâm/Param/Pam-Parâm/Param/Pam-Pam

Pam-Parâm-Parâm-Parâm-Parâm-Parâm-Pam

Parâm-Param-Pam

Parâm-Param-Pam

Parâm-Param-Pam

Parâm-Param-Pam

Parâm-Param-Pam

Parâm-Param-Pam

Parâm-Param-Pam

Parâm-Param-Pam

Parâm-Param-Pam-Pam

Pam-Parâm-Pam-Pam

Esta é, exatamente, a introdução do Hino de Pau Doce. Criativa, nova, personalíssima, inimitável. Apenas, e com muito orgulho, com um longínquo parentesco com a do Hino Nacional Brasileiro. Mas, nada tendo a ver com este, o que seria um sacrilégio contra os acordes iniciais do divhino paudocense. Para que o desinformado leitor possa ter uma idéia (sei que não é nada fácil) da originalidade absoluta da composição do Mestre Pelaginho (em Pau Doce adoramos um diminutivo) e de sua extraordinária capacidade criativa, não só na melodia, como na letra, transcrevo, a seguir, com vetusto ufanismo, os versos do inimitável Hino de Pau Doce. É preciso avisar ao descerebrado leitor que muitas das estrofes não fazem muito sentido, alguns versos são truncados e, às vezes, não há seqüência lógica entre eles, ou sequer ilógica. Esses acidentes de percurso se devem ao parco domínio que Duradouro tinha do idioma português e, porque, como todo paudocense que se preze, o insigne compositor (que podia não se prezar, mas já era, à época da composição, um nativo de quatro costados) estava de pileque em tempo integral. Mas, deguste a beleza desta poesia:

Os virgos deflorando amantes clássicas
Que o polvo-herói, c’o dardo penetrante
E é só dali, beldade enraba os fúdidos
Trilhou corcel da praia lancinante.
Se o senhor desse à irmandade,
Com seus vinhos emborcar um trago forte
Entre seios, que liberdade!
Deus enfia em nosso peito a água da sorte.

Oh! Praiamada! Ensolarada! Sol e sal vês!

Barril com rum bem denso, honra teu fígado
De amora, a caipirança até enlouquece
Sente o gostoso mel, bisonho e insípido
A alma do cachaceiro desvanece.
Brindando com os prós da natureza
Ex-belto, ex-forte em Pau viu dois colossos,
Sem ter futuro, esperas e com certeza
Terás louraças
E morenas mil
Quem em ti já viu
Tal mulherada
Das filhas, estas,
Só lesmão não viu
Que a passarada
Fugiu.

Deitar, externamente, e ver se entende
O céu, o mar e a luz do sol, pro fumo,
Enxugar o barril, maior da América
O luminar alsou de novo o mundo:
A Dulce, a Vera e a Margarida
São risonhos, lindos anjos, sem mais flores,
Não deboches dessa vida,
Pois nossa vida em Pau Doce é só amores.

Oh! Praiamada! Ensolarada! Sol e sal vês!

Bramiu, fragor externo, eu já sinto
É lá o bar que, oitenta, há destilados
E, diga o negro e o loiro dessa fama:
Ter no futuro a glória do “traçado.”
Mas, se achas que a manguaça estava forte
Verás que um paudocense não labuta
Prefere, ao batente, a própria morte.
Terás louraças
E morenas mil
Quem em ti já viu
Tal mulherada
Das filhas, estas,
Só lesmão não viu
Que a passarada
Fugiu.


Autor: Pelágio, o Duradouro.
Qual será a etimologia da palavra plágio?

quarta-feira, 20 de outubro de 2010

31 Teatro histórico

Quinhentos e tantos anos depois, Pau Doce vai realizar, pela primeira vez no Brasil, e se é no Brasil, será no mundo, a mais justa homenagem, mais do que justa, apertadíssima homenagem, jamais feita, ao cara pálida, ao alvíssimo e alvaríssimo ser humano (ser ou mano?) que por aqui chegou nas caravelhas (caras e velhas, na opinião de Cabral & Associados), desviados da rota, estabelecida em contrato com el rey D.Manuel, o Venturinha, por acidente de percurso. Mas, como assim? Perguntará, atônito, o estultíssimo leitor. A primeira homenagem a Cabral? O Brasil não está capilarmente devastado de tanto fazer homenagens, e até mulheragens, ao luso capitão? Não, querido e anencefálico leitor. Uma outra não tem nada a ver com a coisa. A Bahia não é Pau Doce e Brasília, também, não é Pau Doce. Só Pau Doce é Pau Doce. E Pau Doce jamais repetiria quem quer que fosse. Nossa cabralina homenagem será única, especialíssima, “primus inter pares”. E por que tanta exclusividade? Volverá a inquerir, em sua desneuronizada impotência, o ignaro leitor. A especialissimidade de nossa comemoração vem do fato de ser essa a única festa indígena a celebrar o descobridor. Indígena? Indígena! Total e absolutamente indígena. Branco e preto nessa gandaia não têm vez. Quer dizer, quase não têm vez, já que Pau Doce é a liberdade elevada à enésima potência do infinito. Branco e preto só fantasiados de índio. Ou seja, preto é índio, branco é índio e até índio é índio. Na verdade, índio é menos índio que o branco e o preto, já que a maquiagem e a viadagem em Pau Doce são artes sagradas. Em nossa festa, o que tem de índia autêntica paparicando crioulo vestido de pajé, não está escrito. E índio babando por brancona travestida de Iracema, então? Touro Deitado descendente de nigeriano? Lua Estrelada chegada num chucrute? De monte! De monte, é pouco. De cordilheira! Mas, nossa festa é um caso à parte. Não, é um caos à parte. Caos, porque ela é a maior zona. A maiorsona de todas as grandes festas. Tudo com muito respeito: comemoração religiosa, religião comemorativa, liturgias e litorgias, oratórios e orotários, amém! Conhecida, internacionalmente, como “Capando Cabral”, nossa comemoração dura 3 dias. 3 dias e 3 noites, é claro! No primeiro, dá-se a preparação do ritual, que no idioma oficial da festa – o garachupi, mistura insólita de guarani, chulês e tupi – leva o sonoro designativo de Itaporangamirim, que em português culto quer dizer “Lapidação do Pênis Diminuto” e em chulês puro seria “Tasca pedra no pinto anão”. No segundo dia, ocorre a cerimônia “Recuperação do Combalido”, (em chulês, “Refresco pro Pintelho”), ou, oficialmente “Puringoraraporingu”, fase de interregno e descanso entre a exuberância da abertura – abertura, no sentido menos fechado possível, aliás, escancaradíssimo – e a loucura do fechamento ou momento da fechadura (fechadura, não flexadura). Interregno durante o qual, todas as tribos presentes ao megaevento, quiçá até algumas ausentes, dão-se, doam-se, permitem-se, entregam-se aos atos mais libidinosos imagináveis, pornografia pura e desenfreada, como: palitar os dentes em público, comer hambúrguer com catchup, tomar cerveja morna, coçar frieira entre os dedos do pé e até, horror dos horrores, ultrapassar pelo acostamento. No derradeiro dia, assiste-se – a menos que se feche os olhos – ao espetáculo mais sangrento que se tem notícia, desde o tempo em que Nero, o Piedoso, praticava seu esporte predileto “observação da origem da genialidade imperial, a partir do contemplar das vísceras maternas”. É o rito final, em que se dá a degola cabal, também conhecida pelo grito de guerra “Degola o Cabral!” durante o qual, o que sobrou da lapidação do vetusto membro cabralino é extirpado sem dó, nem piedade, pelos piedosos, condoídos e também antropófagos selvícolas, comandados pelo legendário pajé “Estirpaopau”. O espetáculo teatral de encerramento deste maravilhoso tríduo é levado a cabo no magestático palco, o “palcuzão” de Pau Doce. Ocupam o cenário três troupes de atores: uma, à direita, com mais ou menos duzentos componentes, formada, exclusivamente, por índios é a “Comissão de Decepação”; outra, à esquerda do palco, é integrada pelas divindades, espíritos intermediantes, com perto de trinta participantes; a última, postada no centro, conhecida como “Tem cutruco no sufoco”, formada por eles, os próprios, os descobridores, composta por uns quinze membros, prontos a serem, literalmente, desmembrados. Como estratégia de defesa e despistamento, todos os quinze atores aparecem vestidos de Cabral, assim, o verdadeiro, que é apenas um deles, fica protegido pelos outros catorze. Bela estratégia! Os índios, que são índios, mas não são idiotas, esfolam os quinze, por via das dúvidas. É interessante notar que todos os quinze Cabrais ou Cabraus, são atores portugueses autênticos, e que ao terminar o espetáculo, todo ano, os que conseguem, voltam com o que sobrou para Portugal e os que sobram ficam por aqui com o que conseguem. É preciso, no entanto, repor o estoque anualmente. E a cada ano a fila de candidatos, a ter o cabrau decepado, aumenta. Vai entender esses portugas...

sábado, 16 de outubro de 2010

30 A santificação do voluntariado

Aqui em Pau Doce, tudo o que é doce é doce e tudo o que não é doce também é doce. Quer dizer, tudo o que no resto do planeta não é doce, aqui é doce. Ou seja, vivemos o “Milagre da Onidulcificação Universal.” Conseguimos transformar o mais azedo e mais ácido dos limões em uma fruta borbulhante de açúcar. Em primeiríssimo lugar, nos nossos 839 tipos de caipirinha (está lá, catalogado no Livro Guiness: 839!), capitaneados pela pornográfica “Caipirinha XXX” (Xeia de Xarope de Xocolate, havendo, também, a opção GLS: Xeia de Xarope de Xantilly). Mas, nem só de caipirinha sustenta-se o recém-citado MOU (Milagre...). Há, é evidente, muitas outras modalidades de dulcificação limonar. Várias modalidades de caipira (Por favor, não confundir caipira com caipirinha, já que esta é mais mixuruca e a caipira é mais robusta, mais coxuda, mais fornida, digamos mais gostosona): a caipirasca (caipira com casca), a caipiroca (caipira com Coca. Com coca não, com Coca), caipirush (caipira com Crush), caipiranta (caipira com Fanta), guarapira (guaraná com caipira), caipirum (caipira com rum), Caipirisky (caipira com whisky), caipirinho (caipira com vinho), caipirari, (caipira com Campari), caipiródca (caipira com vodca), caipiquila (caipira com tequila), caipimute (caipira com vermute) e, até, caipiringa (caipira com pinga). E incontáveis batidas: baticu (batida de curau), batibronha (batida de bronhafilecus (fruta própria de Pau Doce)). Batissiririca (batida sem sidra, mas rica, rica em carboidratos) e outras e outras e outras.Porém, nem só o limão aqui é adoçado, mas tudo. Tudo, exatamente tudo. O vinagre é doce, a azedinha é doce, a carambola verde é doce e até a salmoura é super doce.No entanto, o mais importante, fundamental mesmo, é que essa dulcificação não se abate apenas sobre as atividades gustativas. Essas relações de sabor são meramente adjetivas. O que interessa mesmo são as realidades substantivas (isso qualquer ANALFAbeto funcioNAL – ANALFANAL – sabe). O esforço físico, por exemplo, aqui em Pau Doce é feito sem o menor esforço físico, tanto que o chamamos de desforço físico. O esforço físico é, portanto, adoçado. Tudo o que represente dificuldade, sofrimento e malhação é recoberto por uma enorme camada de mel, açúcar, doce de leite e melaço, transformando-se em facilidade, dessofrimento e desmalhação.Porém, a mais abjeta, nojenta, sepulcral, pestilenta e calhorda das atitudes humanas é o trabalho. Já sabemos que só o ser humano é capaz de escravizar semelhantes, só o ser humano inventou máquinas de matar (forca, guilhotina, cadeira elétrica), só o ser humano diverte-se, coletivamente, assassinando (touradas e assemelhados), só o ser humano criou venenos letais (formicida, soda cáustica, chumbinho), só o ser humano vende sua própria carne, mas, sobretudo, e pior do que tudo, só o ser humano trabalha. (As formigas e as abelhas não contam por que não recebem salário - ao menos nunca foi encontrado um único contracheque assinado por uma delas...)Como Pau Doce constitui-se no Centro Mundial da Higienização Moral (centralidade que visa a regeneração humana, fazendo deste atual estrupício andante algo semelhante a Eva e Adão antes da transa com a serpente), aqui, como já afirmei em algumas destas celestiais Itinerâncias e, ainda afirmarei em outras, aqui, repito, o trabalho é total, absoluta e radicalmente proibido. Como proibido? - estará rascunhando mentalmente o canhestro leitor, geralmente um bóia-fria intelectual – se já foi dito que nesta praia há uma média de 10 botecos e inferninhos para cada morador? Claro que há, talvez até mais. No entanto, boteco, inferninho, bar, birosca não são considerados empresas, firmas, micro-empresas, mas templos. Os sagrados templos de adoração do Deus Baco e associados.É preciso repetir enfaticamente, com todas as letras: aqui não existe trabalho. O que temos são atividades voluntárias (às vezes, correndo uma graninha de leve) como a dos Sacerdotes e Sacerdotisas Bacanais (do Deus Baco, bem entendido), Agentes de Comercialização Carnal, Entregadoras de Caipireite (caipirinha com leite, como mostra a Foto 1), Segurador de Jegue e Auxiliador de Trepada (Foto 2), Técnico em Esvaziamento de Garrafas, Desvirginadoras de Mancebos, Denunciador de Crime Laboral, Inoculador Espermatozoidal, Puxador de Samba Enredo, Benzedor de Espinhela Caída, Guarda Diurno (Atuando enquanto Pau Doce dorme. Atividade terceirizada, já que ninguém nesta praia submete-se a ficar acordado durante o dia), Escultor Capilar, Decoradora Facial, Exterminador de Cutículas, Anulador de Detritos, Inseminador Não-Artificial, Solista de Atabaque e Redator de Itinerâncias, ou Itinerador de Redações, ou Itinetor de Redarâncias. Chega!Cacete, quanto voluntariado!
                                       
Foto 1                             
Distribuidora de Caipireite  
Atividade voluntária paudocense (não há mais vagas)
  
                                Foto 2                      
Segurador de Jegue e Auxiliador de Trepada                  
Outra voluntaríssima atividade de nossa linda praia