domingo, 1 de agosto de 2010

15 Edilidade paudocense

Pau Doce não é sede de município. Oficialmente, é um bairro de São Sebastião. E, como todo bairro dessa cidade, é uma cidadezinha à parte, semi-independente, quase autônoma. Mas, o “semi” e o “quase” indicam que possui algumas obrigações com o mundo exterior. Uma delas é a eleição municipal. Prefeito e vereadores. Os segundos são do meu interesse. Na verdade, não os vereadores, mas um vereador, já que Pau Doce tem eleitorado para fazer um e sempre o faz. Este ano, tivemos eleição e o candidato desta praia foi ímpar, único e especial. Como, aliás, tudo aqui é especial, único e ímpar. Ele é: 1º- paudocense há anos; 2º- culto; 3º- socialmente responsável; 4º- celibatário; 5º- biólogo de formação, 6º- (profissão que nunca exerceu); 7º- proprietário de uma loja de antiguidades; 8º- de esquerda; 9º- filatelista e 10º- sexualmente indefinido.Vejamos, com brevidade, cada uma dessas características de nosso querido edil Jacinto (ele foi eleito).
1º- Paudocense há anos: faz mais ou menos duas décadas que aquele pós-adolescente arribou em Pau Doce para passar um feriado de 1º de maio. Instalou-se na Pousada Lacinhos Cor-de-Rosa, (que, ao contrário do que possa parecer, mesmo chamando-se “Pousada”, tem preços de hotel quatro estrelas), equipado com uma escandalosa mala Victor Hugo e de sua inseparável “nécessaire”. (“Sem minha companheira” – a “nécessaire”, claro – “não sou ninguém”, costuma dizer nosso herói). Adorou a pousada salgada e o Pau Doce. E ficou. Os três dias iniciais transformaram-se, hoje, em 7305, total que a cada novo dia aumenta de uma unidade (o que não chega a ser muito difícil de entender) e ele continua, como no primeiro dia, morando na “Lacinhos”, dando bandas de Victor Hugo (alguns dizem que também com o Hugo e com o Victor) e dependente da “nécessaire”.
2º- Culto: de família tradicional, (ainda que quase-rica, mais ou menos, digamos, remediada, de fato, remediadíssima, para menos), os Rego, descendentes dos fundadores da importante cidade portuária de Vitória (da Derrota, como deveria, de fato chamar-se, já que sua fundação deveu-se à derrota dos ali-chegantes aos índios, o que os impediu de realizar o projeto de conquistar o interior, obrigando-os a fundar Vitória, ou Derrota?); herdou de seus pais, de muito sólido, apenas uma sólida cultura, (o que, num país de 70% de analfabetos funcionais, não é pouca porcaria). Bem cedo, menino mesmo, aprendeu a calcular o Mínimo Múltiplo e o Máximo Divisor Comuns, de cabeça, (sem nunca ter tido a mais tênue idéia da utilidade desses dois irmãos), e a conjugar os verbos defectivos, (verbos que não possuem a 1ª pessoa do presente do indicativo e, conseqüentemente, como qualquer pancrácio deve perceber, nenhuma das pessoas do presente do subjuntivo, nem as formas dos imperativos que dela derivam, isto é, todas as do imperativo negativo e 3 do imperativo afirmativo, que, como todo iniciante sabe, são a 3ª pessoa do singular e a 1ª e a 3ª do plural: Exemplo: BANIR; e verbos que, no presente do indicativo, só se conjugam nas conhecidíssimas formas arrizotônicas e não possuem, como é claro e natural, nenhuma das pessoas do presente do subjuntivo nem do imperativo negativo; e, no imperativo afirmativo, apresentam apenas a 2ª pessoa do plural, o que é de uma obviedade senegalesca (muito quente): Exemplo: FALIR), o que, ao contrário dos citados cálculos, lhe foi muito útil, já que foi banido algumas vezes e faliu outras tantas.
3º- Socialmente responsável: preocupou-se sempre com a comunidade e seus entornos, ainda que as más línguas insistam em afirmar que prefere os seus entornos à comunidade.
4º- Celibatário: assume-se e sempre se assumiu como tal, negando o sentido que alguns dicionaristas atribuem ao termo: “estéril” ou “infértil”, apenas não pretende tentar. Segundo ele, a vida é muito curta para ser dividida por dois. Traço de personalidade certamente herdado de seus tios paternos, os Aquino.
5º- Biólogo de formação: sempre gostou de bichos, por isso entrou em 4 faculdades, nunca nelas passando da condição de bicho. Na quinta, Ciências Biológicas, chegou ao fim, não sabe bem porquê. Muito menos os professores conseguem explicar.
6º- (Profissão que nunca exerceu): como nunca soube como chegou ao fim do curso, não lhe foi possível, também, descobrir o início da profissão. E não houve meio.
7º- Proprietário de uma loja de antiguidades: encontrou sua verdadeira vocação ao perceber que tinha prazer em guardar fotos da mãe, das avós, das tias e dos tios, dos avós e dos pais, quer dizer, do pai: virou antiquário.
8º- De esquerda: canho, canhoto, não-destro, canhoteiro e, politicamente, conservador.
9º- Filatelista: característica básica da família materna, Pinto, todos os seus membros (membro cai muito bem para esse ramo da família), sobretudo os masculinos, são “filo” (amigos): filantes, filocínicos, filodérmicos, filosofastros e filosdamãe.
10º- Sexualmente indefinido: na realidade, “sexualmente indefinido” é a forma que ele se autoclassifica. Quando em alguma formalidade deve declarar SEXO: “F”/”M”, ele tasca “SI”, mas quando escreve seu nome, seja em documentos, cartas ou abaixo-assinados, se entrega até a raiz dos cabelos: JACINTO PINTO AQUINO REGO.
Nesse quem não votaria?

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