quinta-feira, 22 de julho de 2010

13 A pornografia laboral

Finalmente consegui uma graça de Teus. Convenci-o, depois de longa conversa telefônica, de que me deixasse terminar as férias em paz. Ele está mais tranqüilo porque, para sua sorte, mamãe arranjou outro namorado e parece que vai viajar com ele para a África do Sul. Fiquei sabendo que o novo caso de mamãe se chama Jardim Ângela Futebol Clube e que ela vai bancar uma turnê internacional do namorado (onze titulares, três reservas, técnico, preparador físico e roupeiro). Por mais que ela namore os 17 em sistema de rodízio, o seu preferido, segundo informações não confirmadas, parece ser o roupeiro (deve ser um verdadeiro armário). Teus me revelou que ela esteve mais propensa a namorar o time de rúgbi do São Paulo F. C., mas desistiu ao perceber que ali havia muito anabolizante e pouca testosterona. Pulou fora. Enquanto ela estiver entretida com seu novo amor, tenho certeza que vai me deixar em paz por um tempo. Só não posso é me esquecer de lhe pedir provimentos antes dela viajar. Tenho ainda 5 meses de férias e ficar sem grana com ela no exterior, seria um desastre. Claro que na hora do aperto, sempre posso apelar para Teus. Falando nele, gostaria muito que ele conhecesse Pau Doce. Já tentei convencê-lo a vir até aqui, ao menos, para passar um finzinho-de-semana. Mas, não há jeito. Ele nunca sairia de São Paulo para vir a lugar pequeno e humilde como este. Transita só pelas grandes capitais. De São Paulo a Washington, de Washington a Londres, de Londres a Sidney, de Sidney a Kuala-Lumpur, de Kuala-Lumpur a Cubatão (capital da poluição), daí a São Paulo, fechando o círculo. Retomando, pouco tempo depois, os deslocamentos com outras capitais no itinerário, mantendo apenas a saída e a chegada, impreterivelmente em São Paulo. Não viaja em aviões de carreira, utilizando sempre um de seus jatos pessoais. Teus é tão onipresente, quero dizer, viaja tanto, que talvez seja essa a razão de eu nunca tê-lo visto. Muitos, ao saberem disso, me perguntam: “Como é possível você ser filho de Teus e nunca tê-lo visto?” Mas, é a mais pura verdade, sou filho de Teus, trabalho para Teus e nunca o vi face-a-face. Só a seus emissários, os seus “anjinhos” como são chamados lá na firma. Falo com Teus apenas por telefone. Porém, se eu tivesse tido a pretensão de ter conhecido a todos os meus pais, não teria feito outra coisa na vida, a não ser, correr atrás deles para conhecê-los. Neste momento, por exemplo, que estou prestes a me tornar filho do Jardim Ângela Futebol Clube, como fazer? São 17 de uma só vez e, conhecendo minha mãe como conheço, sei que ela vai mantê-los todos em constante atividade, reclusos e intocados (e entocados também). Agora, porém, que tive assegurado, graças a Teus, o meu fim de férias, quero apenas aproveitar, curtir, descansar e preparar minha tese acerca das “Razões Determinantes da Inexorabilidade Para a Manutenção da Paz Mundial da Perpetuação das Minhas Férias”. Se você, desatento leitor, não entendeu, eu explico. A verdade cósmica de que um acontecimento fortuito e, aparentemente, insignificante pode provocar catástrofes globais, cataclismos hediondos, ou, no sentido inverso, solucionar impasses internacionais, pacificar povos ou produzir o aparecimento de curas milagrosas para doenças incuráveis, desde que tal evento não tenha sido descrito no capítulo inicial da criação, no instante partogênico da vida, nem sempre é levada na devida conta ou recebe a importância que merece. Assim, o vôo de um pássaro não previsto nos anais do tempo, a retirada inadvertida de uma pedra de uma ruína desconhecida, uma espinha adolescente espremida fora dos cânones vitais, um estalar de dedos, um ranger de dentes, um pisar em falso, por mais irrelevante que seja qualquer desses fatos, desde que não inscrito na poeira das estrelas, no momento mesmo do parto do universo, desorganiza de tal forma a existência, que pode destruir ou recriar o mundo todo e o próprio tempo em uma fração de segundo. Meu esforço intelectual será, então, provar a Teus e aos seus, (e meus argumentos e provas cabalísticas são convincentes pacas), que, desde todo o sempre, desde antes do tempo dos Afonsinhos, estava escrito que minhas férias, remuneradas, (disso as entidades do Olimpo nunca abriram mão), seriam eternas. Meu Teus, faço qualquer trabalho só pra não trabalhar!

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